domingo, 26 de abril de 2020

A NÁUSEA [Resenha 069/20]


Jean-Paul Sartre publicou A Náusea na véspera da guerra, em 1938. Ele tinha 34 anos. Precisou travar uma batalha para o editor manter seu manuscrito. Sartre queria chamar seu romance Melancolia. O editor prefere A Náusea. Dois fatos são importantes: (1) A Náusea foi o primeiro romance e serve como entrada à sua obra filosófica fortemente influenciada por autores como Kierkegaard (1813 – 1855), Heidegger (1889-1976) e Husserl (1859-1938), principalmente por este último e sua fenomenologia. (2) O livro não é apenas um romance comum, Sartre criou uma obra prima que mistura filosofia e uma acessível narrativa, e com ela esboçou, usando a arte como artifício, o existencialismo, só formalizado em O Ser e o Nada de 1943.

A Náusea é narrada em primeira pessoa – numa forma que lembra o diário, embora toda a narrativa seja feita no presente – por Antoine Roquentin: um historiador, de trinta e poucos anos, que viajou a Europa inteira e se estabeleceu em uma pequena cidade portuária da França: Bouville. O projeto inicial de Roquentin, ao se estabelecer na cidade, é escrever um livro sobre o Marquês de Rollebon: um personagem obscuro da história francesa, que viveu entre os séculos XVIII e XIX, conhecido tanto por sua fealdade quanto por seu notável poder de sedução. No entanto, a revelação do segredo do Sr. de Rollebon, que Antoine pretende revelar ao término de seu livro, além do esforço da pesquisa e do trabalho intelectual aos quais se impõe, parecem não ser suficientes para aplacar a angústia do protagonista de A Náusea e a falta de sentido que percebe em sua vida. Roquetin mora sozinho em Bouville, e à medida que vai ficando absorto em sua solidão, se descobre com estranhas idéias acerca do sentido da existência e o quanto ela pode ser vazia e sem significado. Quando Roquetin se depara com a realidade ele sente náuseas por acreditar que essa realidade é inócua e sem embasamento.

Num crescente empolgante de dúvidas e emoções, ele percebe que a sólida lógica racional que acreditava constituir a realidade simplesmente não existe. Que os hábitos, valores, crenças etc. não passam de uma fina camada superficial sem qualquer lastro mais profundo. Abalado por essa conscientização, passa a ser acometido pela “Náusea da Existência”, ou seja, pela horrível sensação de sermos contingentes, de não termos um sentido e de que caminhamos para o Nada. Através das reflexões que se originam dessas descobertas e circunstâncias que atingem a sua personagem, SARTRE analisa as questões relativas à liberdade, à responsabilidade, à consciência e ao tempo tecendo um painel magnífico das questões que permeiam a existência humana.

A Náusea é um livro extremamente reflexivo e passível de inúmeras interpretações. Ele aborda a questão que o homem mais anseia solucionar em toda sua vida, o sentido da existência e o quão irracional isso pode ser. Esse é o livro ideal para quem quer se iniciar na aventura intelectual que é a filosofia e com ela tornar a vida muito mais consciente.
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SARTRE, Jean-Paul. A Náusea. São Paulo, SP: Círculo do Livro, 2000.

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