domingo, 24 de fevereiro de 2019

INTELIGÊNCIA HUMILHADA [Resenha]


MADUREIRA, Jonas. Inteligência Humilhada. São Paulo: Vida Nova, 2017.


O LIVRO E A SUA ORIGEM

No mundo cristão existem três tipos de livros: (1) Existe aquele livro acadêmico com notas de rodapés e ideias complexas, que algumas vezes é pouco acessível ao grande público. (2) Existe aquele livro acadêmico desprovido de muitos “ismos” que conversam com o leitor, e o conduz como um guia em meio às maravilhosas jornadas e são cheios de insights. (3) Existe aquele livro acadêmico que é – como já escrevi – acadêmico sem deixar de ser acessível.

Inteligência Humilhada é um daqueles raros livros que passam uma mensagem complexa, cheia de detalhes (as notas de rodapé estão lá), mas que consegue ser ao mesmo tempo simples e prático; sente-se o cuidado pastoral, sem descuidar da teologia. O autor nos conduz na compreensão do conceito de Inteligência Humilhada na história da teologia e suas implicações para o homem todo, não somente com referência ao seu pensamento, mas também às suas ações práticas. 

“Sobre os ombros de alguns gigantes da tradição cristã, apreenderemos melhor essa forma de pensar caracterizada pelo viés da humilhação intelectual. Ou seja, não há ponto de partida que seja mais apropriado para pensar o conceito de inteligência humilhada do que a boa e velha “tradição viva dos que já morreram”, como costumava dizer Jaroslav Pelikan. Para a elaboração do conceito de inteligência humilhada, fomos basicamente influenciados por cinco pensadores da tradição cristã, que nos servem de ponto de partida e fundamentação do conceito: Agostinho de Hipona (354-430), Anselmo da Cantuária (1033-1109), João Calvino (1509-1564), Blaise Pascal (1623-1662) e Herman Dooyeweerd (1894-1977). Ao longo deste livro, essas cinco vozes serão ouvidas, nos mais diversos assuntos. Entretanto, entre os cinco pensadores, não posso negar que Agostinho foi o mais importante para a elaboração do conceito. Depois das Escrituras, a minha principal fonte de inspiração para as reflexões sobre os limites da inteligência humana foi e ainda é o livro X das Confissões, em especial os capítulos 1 a 6.” [p.28]

Neste livro temos assuntos truncados, mas, tratado de forma didática, tais como: o problema do mal, antropologia bíblica, dualidade da natureza e graça e como podemos resolver essas questões através da cosmovisão cristã. 

“Portanto, esse livro é o resultado de no mínimo sete anos de pesquisa e depuração. O tempo dedicado ao texto e às ideias fica muito evidente em vários aspectos (obviamente, a qualidade do material não é resultado apenas do tempo de dedicação, mas especial da habilidade intelectual do autor). A ordem lógica dos temas propostos é impecável, o didatismo ao tratar de temas complexos é notável e o cuidado no uso de cada palavra é impressionante, como se cada frase fosse milimetricamente medida. Nenhuma palavra é desperdiçada. Entre tantos aspectos positivos, destaca-se a proposital fuga do academicismo.” [1]

O livro, além dos agradecimentos e introdução, temos o prefácio da obra escrita pelo saudoso e mestre Russell Shedd, aquele que era piedoso e muito inteligente, tratava de assuntos “truncados” e os tornava acessível a todos que o ouviam e liam as suas obras. 

Nesta resenha iremos trabalhar fazendo um resumo de cada capítulo e resumindo uma ou duas seções de cada capítulo. Na medida que for desenvolvendo o texto, estarei garimpando ideias preciosas, citados por outros colegas que também fizeram resenhas deste livro, dando o devido crédito nas citações de fim de página. O livro está assim dividido:


CAPÍTULO 1 - A TEOLOGIA DIANTE DE DEUS

Neste contexto, o primeiro capítulo, intitulado “A teologia diante de Deus”, argumenta no sentido de que a teologia deve ser feita diante de Deus, ou na expressão de Santo Agostinho, coram Deo, isto é, o esforço do teólogo para apresentar a verdade acerca do conhecimento de Deus deve ser feito na presença de Deus, e para Deus, que conhece todas as coisas, e por esta razão o teólogo deve manter uma postura de humildade, haja vista que tudo o que ele produz, seja falando ou escrevendo, já é conhecido por aquele para quem ele direciona seu trabalho. Ainda no primeiro capítulo, destaque-se para o contraponto feio com a Alegoria da Caverna de Platão, demonstrando os pontos de contato e as dessemelhanças irreconciliáveis entre o pensamento platônico e o pensamento cristão acerca da libertação para o conhecimento.

Fideísmo ou racionalismo? - O fideísta é aquele que defende o ponto de vista de que a fé é suficiente para garantir ou avalizar o conhecimento de Deus. Em suma, deixa-se de lado a razão e prioriza-se a fé. Ao contrário do fideísta, o racionalista é aquele que se esforça para encontrar razões, evidências ou indícios que sirvam para fundamentar o conhecimento de Deus. Ou seja, a fé não é necessária para o conhecimento. 

A inteligência humilhada não quer sacrificar nem a fé nem a razão, mesmo porque não é necessário eliminar uma das duas para chegarmos ao conhecimento de Deus. A inteligência humilhada é a fé que não tem medo de pensar, duvidar ou questionar. A fé não precisa morrer, só precisa pensar. Uma fé assim percebe a racionalidade e a ordem divina nas coisas criadas sem, de forma alguma, anular-se ou destruir-se. É possível ser piedoso e, ao mesmo tempo, inteligente! Em contrapartida, a inteligência humilhada é também a consciência da humilhação da razão que nos faz reconhecer o papel fundamental da fé. A razão não precisa morrer, só precisa dobrar os joelhos. A razão que se sujeita a Deus não deve se envergonhar da sua sujeição, nem se inferiorizar pelo fato de reconhecer sua dependência da revelação. Pelo contrário, a razão, consciente da sua miséria, deveria ser grata pela dádiva da revelação, pois, como aprendemos com nossas mães, quando alguém nos dá um presente, a única reação adequada é a gratidão. É possível ser inteligente e, ao mesmo tempo, piedoso! [p.26-27]

Conhecer-te, ó conhecedor de mim! – Não bastasse a irredutível superioridade de Deus, dependemos também do conhecimento que ele tem de nós para nos conhecermos. Qualquer conhecimento verdadeiro que possamos ter de nós mesmos será sempre fruto de revelação, e não de mera inteligência. Não há autorreflexão que seja suficiente para nos levar ao autêntico autoconhecimento. O conhecimento que Deus tem de nós nos humilha não apenas porque somos ignorantes com respeito a ele, mas sobretudo porque somos ignorantes com respeito a nós próprios e, por conseguinte, dependemos dele para saber realmente quem somos. Nosso problema se origina no fato de — a despeito de nossa ignorância sobre quem somos - termos a pretensão de falar sobre Deus, ostentando um discurso do tipo: “O que você quer saber sobre Deus? Sei tudo sobre ele!”, como uma espécie de “Teólogo Mister M”, um especialista em desvendar os mistérios divinos. Quanta presunção! Mal sabemos o que precisamos saber sobre nós e já nos precipitamos a falar sobre Deus apenas contando com nossas limitadas capacidades intelectuais. Quanta arrogância! Acreditamos que podemos elaborar profundas proposições teológicas sobre Deus, quando, na verdade, ignoramos a nós mesmos. Ainda que tenhamos algum acesso ao nosso coração, permaneceremos ignorantes quanto a nós mesmos enquanto não nos submetermos à revelação que Deus tem a nosso respeito. Mesmo assim, diante dessa grande desvantagem, há momentos em que, conscientes ou inconscientes, ainda acreditamos que podemos falar com propriedade sobre Deus. Ledo engano, lépida arrogância. Quem, por si só, conhecerá a Deus e a si mesmo de modo adequado? [p.43-44]

Humildade Arrogante - O reformador suíço Ulrico Zuínglio (1484-1531) dizia que, por nós mesmos, não sabemos mais sobre a natureza de Deus do que os besouros sabem sobre a natureza dos seres humanos. Ou seja, por nós mesmos, nada sabemos sobre Deus. A constatação de tamanha ignorância deveria nos tornar mais humildes, ou, no mínimo, nos fazer falar menos. Afinal, como disse o filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein, “sobre aquilo de que não se pode falar, deve-se calar”. Mas se, contrários ao bom senso, desatamos a falar copiosamente sobre o que não conhecemos, das duas, uma: ou somos tolos ou somos arrogantes. Seremos tolos se, por mero impulso verborrágico, tagarelarmos sobre o que não conhecemos; seremos arrogantes se, conscientes de nossa ignorância, falarmos como se não fôssemos ignorantes. Em outras palavras, se, por um lado, a tolice não passa de atitude irrefletida, por outro, a arrogância não é outra coisa senão ignorância dissimulada. Afinal, é possível ser ignorante o suficiente para não apenas ser arrogante, mas, ao mesmo tempo, se passar por humilde. [p.44]

As demais seções deste capítulo são: A condição da humilhação, Autoabsorção narcisista, e O tolo e as sombras da caverna


CAPÍTULO 2 - O CONHECIMENTO NA DESGRAÇA

Após lançar as bases do discurso, o autor lança as bases epistemológicas dos argumentos com o que ele chama de “conhecimento na desgraça”. Basicamente, “toda busca por conhecimento ou sabedoria é, de certo modo, uma maneira de lidar com a angústia referente ao sentido da vida e à experiência do vazio existencial que gera o clamor por salvação” [p. 72], o que torna a abordagem epistemológica indispensável.

O capítulo 2 analisa como nossa inteligência sofreu com os efeitos da queda e se apresenta limitada. O conhecimento nessa situação de desgraça nos torna incapazes de encontrar a verdade por esforço próprio. Dependemos de Deus. É por isso que os mais diversos campos da atividade humana são limitados e apresentam sinais dessa queda. Por exemplo, desde o século XVIII, enalteceu-se como ferramentas de salvação humanas a ciência, um movimento que tem sido desde o início acusado como cientificismo. Esse cientificismo de forma reducionista coloca a ciência em um pedestal como a única fonte de conhecimento, paz e progresso. O cristão sabe, ou deveria saber, que o homem é um ser dependente da graça de Deus e que deve depositar sua inteligência aos pés da Cruz; é nessa humilhante posição (como nos é apontado pela belíssima imagem da capa do livro – "Cristo lavando os pés de Pedro", pintura de Ford Madox Brown), que devemos deixar cativo nosso pensamento. [2]

A despeito da incapacidade da mente humana decorrente da Queda, que a torna dependente da revelação divina, o homem precisa lidar com a realidade de que foi feito para Deus. Novamente partindo de Agostinho, Jonas afirma: “o coração encontrará repouso apenas quando reencontrar sua origem e, ao mesmo tempo, seu destino último. Em outras palavras, Deus nos criou como uma flecha lançada em sua própria direção, o que significa que o ‘coração inquieto’ não é outra coisa senão uma disposição ou inclinação natural que movimenta o homem todo para Deus, sua origem e seu destino. [...] Embora a Queda não seja capaz de destruir essa inclinação natural do coração, ela é capaz de alterar sua direcionalidade, fazendo com que o homem todo se afaste do fim último para o qual foi criado. [...] Quando pecou, o homem não acertou outro alvo; ele errou o único alvo disponível” (p.75-77). [3]

Epistemologia monergista - O autor expõe a categoria de pensamento a qual a inteligência humilhada pertence, a saber, a monergista, segundo a qual não é possível se obter algum conhecimento de Deus sem que o próprio Deus propicie este conhecimento. Em outras palavras, o autor defende a total dependência do teólogo em relação à revelação de Deus para que seja possível produzir algum conhecimento de Deus. Esta dependência, que não é decorrente da Queda (haja vista a anterioridade da dependência em virtude da insuficiência humana), é motivo para que, despindo-se de qualquer arrogância, o homem venha reconhecer a condição de humilhação que lhe é inerente.

A teologia natural e o crime do chocolate - A tradição reformada considerou como um dos efeitos noéticos da Queda essa impossibilidade de que o homem, munido tão somente da razão, alcance um conhecimento suficiente de Deus [...] o adjetivo “noético” não tem relação alguma com Noé, mas refere-se a nous, um termo grego que quer dizer “intelecto”, “mente”, e relaciona-se com outros termos, como noema (“o conteúdo pensado”) e noesis (“o ato de pensar”), que são próprios da epistemologia ou teoria do conhecimento. Assim, quando nos referimos aos efeitos noéticos da Queda, estamos considerando o fato de que a Queda não interferiu apenas nos âmbitos material e volitivo dos seres humanos, mas também em sua faculdade intelectual. Então, seguindo de perto Agostinho e Anselmo, entendemos que a nossa inteligência, por mais que seja uma das expressões mais fortes e significativas da imago Dei (isto é, da imagem de Deus), ainda assim, não está blindada contra os efeitos intelectuais da Queda. E, por esse motivo, não podemos simplesmente por nós mesmos, ou seja, pelo nosso puro pensamento, chegar ao conhecimento de Deus. Estamos perdidos e não sabemos o caminho de volta. Como diria Anselmo: “Miserável sorte a do homem quando perdeu aquilo para o qual foi feito. Dura e cruel queda!”. [p.80]

As demais seções deste capítulo são: O miserável homem-flecha, O casaco de Pascal, O cúmulo da miséria e Livres-pensadores ou gnósticos enrustidos?


CAPÍTULO 3 - O DEUS HUMILHADO

Neste capítulo que o autor denomina de “Deus humilhado”, ele aborda os atributos da bondade e poder divinos, e tomando por base o texto do credo apostólico, o autor argumenta sobre a suprarracionalidade de alguns mistérios das escrituras, os quais não podem ser considerados contradições lógicas, mas também não podem ser explicados pela limitada mente humana. Em seguida, o autor apresenta um dos maiores problemas teológicos que tende a nos causar desconforto intelectual: o problema do mal. Em nossa arrogância intelectual, colocamos Deus no banco dos réus para que se explique; em resposta somos apontados para a humilhação de seu Filho; o Deus cristão não é uma divindade que se diverte com os males do mundo, mas sim que se compraz com as necessidades humanas e desce para fazer parte desses sofrimentos.

Depois de discorrer sobre o Deus humilhado, o autor denomina uma das seções deste capítulo de “O Deus da Bíblia é cruel?” (p.157-176), concluindo, “a explicação que condiz com a fé cristã é aquela que sustenta a crença em Deus Pai, todo-poderoso, a despeito da presença do mal no mundo, mesmo porque somente a crença em Deus Pai, todo-poderoso, pode dar para o cristão a esperança de que o mal será destruído na consumação dos séculos”. Até chegar a essa conclusão, o autor demonstra profunda habilidade filosófica e vasto domínio bibliográfico, citando com propriedade C. S. Lewis, D. A. Carson, Dietrich Bonhoeffer e Alvin Plantinga. Recursos muito bem administrados para combater os argumentos de Richard Dawkins, Ludwig Feuerbach e companhia. [4]

Deus no banco dos réus – É justamente por causa da inseparabilidade que há entre a bondade suprema e o poder absoluto de Deus que o problema do mal se impõe como uma questão demasiado espinhosa, tanto para cristãos como para qualquer pessoa que sustente a crença básica em um Deus todo-bondoso tanto quanto todo-poderoso. [...] Ao considerar o mistério que diz respeito ao problema do mal, o cristão crê que Deus tem razões para permitir o mal. Contudo, o que ele alega — ou reconhece — é a sua ignorância quanto à especificidade dessas razões. Portanto, Cheung erra ao afirmar que “alegações de mistério” ou “reconhecimento da ignorância” sempre implicariam uma espécie de licença para a irracionalidade. [...] De acordo com Herman Bavinck, “A origem do mal é um mistério. O mal não veio de Deus e, ao mesmo tempo, não está excluído do seu conselho. […] Depois da questão da própria existência, a questão da origem do mal é o maior enigma da vida e a cruz mais pesada que o intelecto tem de carregar”. Pascal vai ainda mais longe ao afirmar que o problema do mal não somente é o mistério mais enigmático do nosso conhecimento, mas, ao ignorarmos esse mistério, que é o mais incompreensível de todos, nos tornamos incompreensíveis a nós mesmos. [p.118,127,129]

As demais seções deste capítulo são: A bondade e o poder de Deus, A ofensa da onipotência, A kénōsis de Cristo, A phrónēsis de Cristo, O Deus da Bíblia é cruel? Teodiceias e orações sujas


CAPÍTULO 4 - A TEOLOGIA DO AUTOCONHECIMENTO

No capítulo 4, o que trata da teologia do autoconhecimento, o autor discorre sobre a necessidade de o homem conhecer a si próprio, argumentando que este conhecimento somente é possível a partir do verdadeiro conhecimento que se tem sobre Deus. Isto porque o conhecimento de Deus provoca a humildade e uma suspeita de si mesmo. Ora, com todas as limitações que lhe são inerentes, o homem deveria, acima de tudo, suspeitar acerca de si mesmo, pois o único conhecimento confiável é aquele oriundo de Deus. 

A ordem dos assuntos que o autor coloca é a seguinte: Para o homem se conhecer deve saber que não é somente cérebro-mente, mas que também nas escrituras é tratado como sendo composto por alma, coração, carne e espírito; na ordem, (1) um ser desejante; (2) um ser deliberante, que delibera sobre a direcionalidade do desejo; (3) um ser contingente, limitado pela fragilidade da carne; e (4) um ser vivente, cuja vida/espírito vem de Deus.

Um outro aspecto importante é a abordagem holística da antropologia feita pelo autor. Tomando como base os estudos teológicos de Anthony Hoekema e os estudos vétero-testamentários de Hans Wolff, Jonas procura refutar a ideia de uma divisão tripartite ou bipartite (tricotomia e dicotomia) do homem. Para o autor, não é que tenha duas ou três substâncias, mas que os verbetes bíblicos apontam aspectos distintos de sua essência, mas que estão necessariamente conectados, sem cortes. Ao tratar de nefesh, a Bíblia não expressa a “alma” do homem em distinção do corpo, mas expressa seu aspecto desejante. O verbete lev (coração) aponta para o homem deliberante. Basar (carne) trata do homem contingente; espírito (ruah), por sua vez, trata do homem vivente.

Esta talvez seja a parte mais chocante da descoberta da teologia do autor para os debatedores de plantão (dicotomistas x tricotomistas). Porém, entendam que Jonas Madureira, neste sentido, está em concordância com Hoekema. É bem possível, também, que tenha muita afinidade com o conceito de unidade condicional defendido por Millard J. Erickson Erickson e Franklin Ferreira. Alguns teólogos replicam que desconsiderar este aspecto dicotomista envolve uma percepção sensorial do atual prisma de nossa existência e por isto os que negam a dualidade não conseguem entender o homem com porções essenciais distintas, mas ao se considerar a existência após a morte, o que é impossível fazer da perspectiva sensorial, é aí que se pode perceber a distinção. O fato é que a exposição de Jonas Madureira foi muito convincente e bem fundamentada exegeticamente. Para uma defesa do dicotomismo, cf.: GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática: atual e exaustiva. São Paulo: Vida Nova, 1999, pp. 388-402. [5]

A natureza do autoconhecimento - Os psicólogos dizem que o autoconhecimento é transformador, e eu creio nisso, porém não há autoconhecimento que seja mais transformador do que aquele que é fruto da revelação bíblica. Por quê? Porque somente a revelação bíblica oferece a explicação antropológica adequada à realidade do homem insuficiente, isto é, do homem marcado pela eterna referência a Deus. Além de pressupor uma epistemologia monergista, o conceito de inteligência humilhada pressupõe uma teologia do autoconhecimento, que não é outra coisa senão uma explicação da correlação entre o conhecimento de Deus e o conhecimento de nós mesmos. Trata-se de uma compreensão de Deus e do ser humano fundamentada em duas verdades essenciais: (1) ninguém pode conhecer de modo adequado a si próprio sem o conhecimento adequado de Deus; (2) ninguém pode conhecer verdadeiramente a Deus e ao mesmo tempo ser um ignorante sobre si mesmo. Tanto Agostinho como Calvino entendiam que o conhecimento de Deus e de nós mesmos são coisas correlatas (cf. Confissões X,1-6 e Institutas I.1.1-3). [p.190]

As demais seções deste capítulo são: Autoconhecimento e referência, A gramática da antropologia bíblica, O homem desejante, O homem deliberante, O homem contingente e O homem vivente.


CAPÍTULO 5 - A TRAIÇÃO DOS TEÓLOGOS

Assim, chegamos ao mais denso capítulo, que trata da “Traição dos teólogos”, que para Jonas se origina na insubmissão à cosmovisão cristã. Nesse capítulo o autor explora o conceito de cosmovisão cristã (que considero um dos conceitos teológicos mais importantes de serem conhecidos pela igreja brasileira, impactando ações de missão e pregação). O abandono da cosmovisão cristã tem produzido crentes pouco apegados aos estudos, com uma visão negativa do trabalho (“fazei tudo pela glória de Deus”, 1 Co 10.31) e avesso ao conhecimento científico. Construímos redomas “cristãs” e não nos envolvemos no mundo. Jonas não deixa de enfatizar a prioridade da pregação, mas sem cair em dualismos, nos quais a igreja e o “mundo” são coisas separadas.

“O teólogo, nessa perspectiva, deve se manter fiel à cosmovisão cristã, e isto somente é possível se o mesmo, nas palavras de Agostinho, tiver sido ferido pela Palavra de Deus. O autor dedica algumas laudas para conceituar cosmovisão, destrinchando o conceito já apresentado por James W. Sire, e então arremata a questão, explicando que a traição do teólogo se dá quando este abandona a cosmovisão cristã para abraçar o secularismo disfarçado de teologia.” [6]

A ferida do teólogo - A Palavra ofende e fere o homem em sua miséria, e é essa ferida que gera o amor. Por causa dessa ferida, o discurso de negação e até mesmo de ódio vai, aos poucos, dando lugar à confissão de fé, de arrependimento e de amor. Se a Palavra não ferir o coração do homem, não há nada que ele possa fazer para reverter o quadro da sua miséria, ou, dito de outra maneira, além da Palavra não há nada que seja poderoso o suficiente para fazer com que o teólogo ame a Deus acima de todas as coisas. Por outro lado, a Palavra é também o amor de Deus que transbordou e alcançou o homem em sua depravação. Nesse caso, a ferida é também um sinal desse transbordamento do amor divino, que gera, no teólogo, um desejo incansável de saber quem Deus é. Mas o que acontece depois que o teólogo é ferido? Ele ora. Todo o labor do teólogo para conhecer o Deus da Palavra deve terminar em oração. Portanto, a obra mais importante de um teólogo não é um tratado de teologia, mas, sim, sua oração. Ora, não é à toa que as Confissões sejam exatamente a oração de um teólogo que transbordou de amor. [...]O teólogo que é ferido pela Palavra não busca conhecimento para amar. Ele ama e, por isso, busca conhecimento. [p.254-255]

Estudo de caso: Carl F. H. Henry – Nesta seção, o autor traz a biografia do fundamentalista Carl Henry, que defendeu o ponto de equilíbrio entre a defesa da ortodoxia bíblica e o engajamento do cristão nas problemáticas do mundo. A biografia de Carl Henry é apresentada ao longo de várias laudas deste último capítulo, a qual ocupou grande parte do mesmo, e em nossa visão, quebrou um pouco o ritmo impresso pelas ideias em torno do conceito de inteligência humilhada, o qual somente é tratado de forma mais explícita no final do capítulo, momento em que, inclusive, a teologia racionalista de Carl Henry também recebe críticas pelo autor.

As demais seções deste capítulo são: As tentações do teólogo, O compromisso do teólogo e A cosmovisão do teólogo.


CONCLUSÃO

O livro de Jonas Madureira é um chamado ao crente colocar sua inteligência a serviço do Reino. Ao terminar o livro com uma oração, expõe na prática o que todo crente deve fazer: cultivar sua mente, mas em profunda devoção. É uma obra que procura trazer um equilíbrio necessário à igreja brasileira, que tem profundas resistências ao trabalho intelectual. Em uma sociedade onde reina o secularismo e uma pretensa autonomia do pensamento, principalmente expostas em nossas universidades, já é tempo do cristão recuperar a cosmovisão cristã.

Em todo o livro, a quantidade de citações de teólogos brilhantes é enorme, sejam eles reformados ou não, bem como de grandes nomes da tradição filosófica, desde os mais famosos até aqueles não tão conhecidos. Quer por meio de citações diretas ou por meio de recomendações de leitura para aprofundamento, o autor demonstra profunda habilidade e domínio da filosofia e da teologia. Não deixe passar desapercebidas as preciosas recomendações, explicações e complementações feitas em notas de rodapé. [7]

Este livro de Jonas Madureira é um grande exemplo do renascimento da mente cristã, sem deixar a piedade de lado, que vem ocorrendo entre alguns teólogos brasileiros. Oremos para que essa mensagem se propague e que nossas igrejas e seus membros não sejam um vazio intelectual.

Um livro fundamental pra restarmos conceitos importantes e refletirmos para onde pode ir o protestantismo brasileiro.

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[1] João Guilherme. Resenha de Inteligência Humilhada. Disponivel in: https://www.box95.com.br/post/resenha-inteligencia-humilhada-jonas-madureira Acesso em 13 fev 2019.
[2] BORGES, L. A. Inteligência Humilhada. Disponível em: http://oracaovalente.blogspot.com/2017/09/o-evangelicalismo-brasileiro-por-muito.html Acesso em 09 fev 2019.
[3] João Guilherme. Resenha de Inteligência Humilhada. Disponivel in: https://www.box95.com.br/post/resenha-inteligencia-humilhada-jonas-madureira Acesso em 13 fev 2019.
[4] João Guilherme. Resenha de Inteligência Humilhada. Disponível in: https://www.box95.com.br/post/resenha-inteligencia-humilhada-jonas-madureira Acesso em 13 fev 2019.
[5] Citado F. C. Furtado Disponível em <https://farescamurcafurtado.wordpress.com/2017/07/27/resenha-30-inteligencia-humilhada-jonas-madureira/> Acesso em 20 fev. 2019
[6] Jefferson S. Oliveira. Inteligência Humilhada. Disponível https://jeffersonoliveira.wordpress.com/2017/07/22/inteligencia-humilhada/ Acesso em 20 fev. 2019.
[7] João Guilherme. Resenha de Inteligência Humilhada. Disponível in: https://www.box95.com.br/post/resenha-inteligencia-humilhada-jonas-madureira Acesso em 13 fev 2019

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

DICIONÁRIO VINE [Textos e Resenha]


VINE, W. E.; UNGER, Merril F.; JR, William White. Dicionário VINE – O significado exegético e expositivo das palavras do Antigo e Novo Testamento. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2016. 


O LIVRO E SEUS AUTORES 

Achava-se Jerônimo num deserto do Oriente Médio, por volta do ano 373 de Nosso Senhor, quando encontrou um judeu que se pôs, amorosa e pacientemente, a ensinar-lhe a língua hebraica. Embora não saibamos o nome daquele professor, o certo é que este levou o dedicado aluno a não somente aprender como também a amar o idioma no qual foi escrito o Antigo Testamento. Já dominando o hebraico, e já capaz de empreender as mais complexas exegeses, Jerônimo mudou-se para Antioquia, onde foi consagrado para o ministério cristão.

Em 396, depois de longas jornadas missionárias e de inestimáveis serviços à Igreja de Cristo, instala-se Jerônimo em Belém de Judá. E, aqui, em companhia de outros ministros, igualmente comprometidos com a ortodoxia e com a erudição bíblica, dá início à obra que o tornaria imortal: a tradução do Antigo e do Novo Testamento para o latim. Nesta tarefa, houve-se ele, juntamente com os seus irmãos de ministério, com suma disciplina e seráfico zelo. Afinal, estava traduzindo a Palavra de Deus para uma gente que, embora Igreja de Cristo, não estava totalmente afeita à sublimidade do pensamento hebreu nem à logicidade da expressão grega. 

Entre os prados da Judéia, que ainda ressonavam a lira de Davi e os sublimados poemas de Salomão, nasce a Vulgata Latina. 

Muitas foram as lutas enfrentadas por Jerônimo. Se por um lado, suportava a fúria dos pagãos, por outro, via-se às voltas com aqueles que, conquanto se identificassem como irmãos em Cristo, de Cristo já se haviam apartado. E a inclemência do clima do Médio Oriente? De dia a calmaria e o mormaço; de noite, aquela geada que, pouco a pouco, vai enregelando os ossos. Jerônimo, porém, tinha um ideal; e por este ideal, bateu-se ele até que viesse a lume a Vulgata Latina, que muito auxiliou os crentes romanos a firmarem-se na fé confiada, de uma vez por todas, aos santos. 

Não obstante toda a sua erudição, conservava-se Jerônimo como um humilde servo de Cristo; do Senhor, imitava-lhe todos os gestos e exemplos como ressalta o insigne escritor português Ramalho Ortigão: “S. Jerônimo, o grande lume da Igreja, depunha a pena para lavar os pés aos camelos dos viageiros que lhe pernoitavam no mosteiro”. Até no quebrantamento era Jerônimo um inigualável santo. 

De igual modo qualificados, outros homens puseram-se a seguir as pisadas de Jerônimo, a fim de que os seus povos tivessem a Palavra de Deus no vernáculo. O que dizer de Martinho Lutero? Foi com a sua tradução, bela e perfeita, que nasceu a moderna língua alemã. Hoje, todos evocamos Lutero como o grande reformador da igreja do Século XVI. Mas, o que seria da Reforma Protestante sem a sua versão das Escrituras para o germânico? Se a Alemanha é conhecida hoje como a Atenas do Ocidente, devemo-lo ao Dr. Lutero que, através de sua versão da Bíblia, entrou a gramaticar um idioma que, até então, era tido como bárbaro. 

E a Versão do Rei Tiago? Tão linda é esta tradução bíblica; tão majestosa e requintada se ergue esta versão das sagradas letras; tão sublime e sobranceira é esta interpretação do Livro de Deus que, ainda que todos os livros e documentos em língua inglesa desaparecessem, e ficasse apenas a Bíblia do Rei Tiago, seria esta mais do que suficiente para, a partir dela, recompor o idioma de William Shakespeare. 

Não teve o português uma gênese tão sacra e sublime. Em sua fase moderna, a última flor do Latium refez-se no Os Lusíadas de Camões. Foi a partir deste épico, que a nossa língua, ainda inculta, posto que belíssima, foi ganhando suas regras e feições definitivas. Até então, não parecia nem português, nem castelhado; era um galego primitivo que lutava por desvencilhar-se dos barbarismos que, desde a saída dos romanos, foram apegando-se aos falares da Península Ibérica até que estes ganharam foros de idioma. Se lermos as crônicas de Fernão Lopes, haveremos de constatar que o idioma falado hoje, pelas nações lusófonas, em nada lembra o português do Século XV. 

Ora, se a língua portuguesa tornou-se bela a partir de Camões, como não seria hoje houvera tido como base uma versão segura e consciente das Escrituras Sagradas? Infelizmente, uma versão completa da Bíblia em nosso idioma somente viria a público em 1681 através do pastor português João Ferreira de Almeida. As versões que existiam até então em Portugal eram parciais, e não chegavam a caracterizar um trabalho editorial. 

Desde então, vem a Versão de Almeida sendo submetida a revisões periódicas até configurar-se como uma grande e singular peça da literatura portuguesa. Infelizmente, a Academia Brasileira de Letras e a Academia de Ciências de Lisboa ainda não atentaram para a grandiosidade das várias traduções bíblicas que hoje possuímos em português, nem para o avanço que representam estas para o desenvolvimento da expressão cultural lusíada. Os homens de letras seculares parecem ignorar que toda versão da Bíblia é o resultado final de um longo processo de erudição. 

Foi pensando nos benefícios da erudição bíblica que a CPAD houve por bem lançar o Dicionário Vine. Escrito por W. E. Vine, tornou-se ele numa referência obrigatória a todos os que se dedicam à lingüistica e à filologia sacra. Dessa forma, terá o leitor fácil acesso às palavras hebraicas e gregas que compõem o vocabulário do Antigo e do Novo Testamento. Apenso a este magistral léxico, um conjunto de ilustrações que, extraído do texto sagrado, mostra toda a evolução do vocabulário bíblico. 

Já imaginou se Jerônimo, Lutero ou João Ferreira de Almeida tivessem acesso a uma obra como o Dicionário de Vine? Que esta obra venha a enriquecer o campo da filologia sagrada nos países de expressão lusíada, preparando novos eruditos, a fim de que saibam estes como trabalhar devidamente o texto sagrado. Somente assim, poderemos manter a qualidade das versões das Sagradas Escrituras em nosso idioma. [1] 

Dicionario Expositivo VINE, publicado pela primeira vez em 1939, é fruto de uma vida inteira de estudo e pesquisa.

W. E. Vine (1873-1949) é reconhecido como um dos principais estudiosos do grego no mundo. 

Merril F. Unger, Th.M. Th.D. Ph.D. (1909-1980) foi professor emérito de Semítica e do antigo Testamento no Dallas Theological Seminary. É autor de muitas obras e comentários de referência bíblica. 

William White Jr., Th.M. Ph.D., é especialista em línguas bíblicas e história da ciência. Editou, juntamente com James I. Packer e Merril C. Tenney, a obra The Bible Almanac. 


A IMPORTÂNCIA DO DICIONÁRIO 

O Dicionário Expositivo Será ferramenta útil nas mãos do estudante que tem pouco ou nenhum treinamento formal no idioma hebraico. Ele abrirá os tesouros da verdade que estão enterrados no idioma original do Antigo Testamento, às vezes perto da superfície e, às vezes, profundamente encravado bem abaixo da superfície. 

O estudante treinado em hebraico descobrirá que o Dicionário Expositivo é fonte de referência de fácil manejo. Mas o estudante sem treinamento em hebraico experimentará excitação especial ao poder usar esta ferramenta de estudo na exploração das verdades da Bíblia hebraica que, de outro modo, não lhe estariam acessíveis. 

É claro que é possível ser estudante sério do Antigo Testamento sem ter um conhecimento do idioma hebraico. As traduções e comentários são de valor inestimável e têm seu lugar adequado. Mas um livro de consulta que abre o idioma no qual as Escrituras foram originalmente reveladas e registradas, e que as torna acessíveis a leitores não familiarizados com a língua original, tem valor que imediatamente se mostra. 

Como língua divinamente escolhida para registrar as profecias de Cristo, o hebraico possui qualidades admiráveis para a tarefa incumbida. O idioma tem qualidade singularmente rítmica e musical. Na forma poética, contém sobretudo uma nobre dignidade de estilo, combinada com uma vivacidade que o torna veículo eficaz para a expressão da verdade sagrada. As idéias por trás do vocabulário dão ao hebraico uma natureza vivaz e pitoresca. 

A maioria das palavras hebraicas é formada com base em raízes verbais compostas de três consoantes chamadas radicais. Há aproximadamente 1.850 destas raízes no Antigo Testamento, das quais foram derivados vários substantivos e outras classes de palavras. Muitas destas raízes representam conceitos teológicos, morais e cerimoniais que foram obscurecidos pela passagem do tempo; recente pesquisa arqueológica e lingüística está lançando nova luz sobre muitos destes conceitos. Os estudiosos do Antigo Testamento notam que o hebraico bíblico pode ser comparado com outros idiomas semíticos, como o árabe, assírio, ugarítico, etíope e aramaico, para se descobrir o significado básico de muitos termos antes obscuros. 

Mas não é suficiente meramente esclarecer o significado de cada palavra-raiz. Cada palavra pode assumir diferentes acepções quando é empregada em contextos diversos. Temos de estudar as várias ocorrências bíblicas da palavra para chegar a um entendimento preciso do seu uso intencional. 

Este tipo de pesquisa introduz os estudantes do hebraico a um novo mundo de compreensão do Antigo Testamento. Mas como este material pode se tornar acessível aos que não falam hebraico? Este é o propósito da presente obra. 

Agora o estudante leigo pode ter diante de si a raiz hebraica, ou uma palavra hebraica baseada nessa raiz, e seguir o curso do seu desenvolvimento para o uso na passagem que estuda. Além disso, ele obtém uma avaliação da riqueza e variedade do vocabulário hebraico. Por exemplo, os sinônimos hebraicos têm repercussões doutrinais essenciais, como a palavra virgem em Isaías 7.14, comparada com palavras semelhantes que significam “moça”. Em alguns casos, um jogo de palavras é virtualmente impossível que seja refletido na tradução (por exemplo, Sf 2.4-7). Algumas palavras hebraicas podem ter significados bastante diferentes — às vezes precisamente o oposto — em contextos diferentes; assim, a palavra bãrak pode significar “abençoar” ou “amaldiçoar”, e gã’al pode significar “redimir” ou “poluir”. 

É óbvio que o estudante leigo terá alguma desvantagem em não conhecer o hebraico. Contudo, é justo dizer que um dicionário expositivo moderno, que faz uma seleção feliz das palavras hebraicas mais importantes do Antigo Testamento, abrirá um depósito de riquezas da verdade contidas na Bíblia hebraica. Oferece tremendo benefício ao estudo expressivo da Escritura. Torna-se obra de consulta fundamental a todos os estudantes sérios da Bíblia. 

Os escritos do Novo Testamento são, em grande medida, baseados na revelação de Deus no Antigo Testamento. Para entender os temas da Criação, Queda e Restauração apresentados no Novo Testamento, é preciso ler sua origem no Antigo Testamento. 

O Novo Testamento foi escrito no dialeto popular de um idioma indo-europeu, o grego. O Antigo Testamento foi escrito nos idiomas semíticos do hebraico e aramaico. Durante séculos, estudantes leigos da Bíblia achavam muito difícil entender a estrutura do hebraico bíblico. Os guias de estudo do hebraico bíblico são projetados para pessoas que leem hebraico — e muitos destes guias foram escritos em alemão, o que só aumenta a dificuldade.

Este Dicionário Expositivo apresenta cerca de 500 termos significativos do Antigo Testamento para os leitores leigos que não estão familiarizados com o hebraico. Descreve a freqüência, uso e significado destes termos tão completamente quanto possível. Nenhuma fonte foi ignorada no esforço de trazer a mais recente erudição hebraica para o estudante que a busca. Espera-se que este pequeno livro de consulta venha a iluminar os estudantes da Bíblia para que vejam as riquezas da verdade de Deus contidas no Antigo Testamento. 


COMO USAR ESTE LIVRO 

Quando começar um estudo de palavras de determinado termo hebraico, tenha em mãos boas edições de pelo menos três versões em português do Antigo Testamento. Sempre tenha uma versão da ARC, edição de 1995, a qual é utilizada como padrão neste dicionário, da ARA e uma versão coloquial como A Bíblia Viva. Você também deve ter uma boa concordância. 

O Dicionário Expositivo oferece vasta gama de significados para a maioria das palavras hebraicas. Tais significados não devem ser substituídos uns pelos outros sem que o uso do termo em seus contextos diferentes seja cuidadosamente revisto. Todas as palavras hebraicas têm significados diferentes — às vezes, até significados opostos —, portanto devem ser estudadas em todas as suas ocorrências e não em uma só. 

Esforce-se por ser consistente ao traduzir determinada palavra hebraica em contextos diferentes. Busque o menor número de palavras portuguesas equivalentes. Os colaboradores deste livro já fizeram pesquisa extensa nas línguas originais e na literatura erudita moderna. Você pode tirar o melhor proveito do trabalho que fizeram, observando os vários usos de cada palavra a fim de obter uma visão equilibrada. 

Comparação e frequência são dois fatores fundamentais no estudo de palavras bíblicas. Escreva as passagens que você está comparando. Não tenha medo de observar todas as ocorrências de certa palavra. O tempo que você gasta abrirá sua Bíblia como nunca antes. [2]


CONCLUSÃO E RECOMENDAÇÃO 

O Dicionário Vine torna possível ao estudante que tem bastante, limitada ou nenhuma formação em grego ou hebraico estudar o significado das palavras bíblicas nas línguas originais. As palavras equivalentes em português estão alistadas alfabeticamente ao longo do texto, junto com as palavras ou gregas ou hebraicas das quais são traduzidas. Também estão inclusas várias acepções, além de passagens da Bíblia Sagrada que ilustram usos particulares. 

O Dicionário Vine está organizado de modo tal que é, a um só tempo dicionário e comentário. Reconhecido no mundo inteiro como ferramenta essencial para o estudante da Bíblia, O Dicionário Vine capacita-o a explorar as riquezas da Bíblia de forma mais profunda, porque você pode: descobrir os significados de mais de 6.000 palavras bíblicas no original grego ou hebraico. Desfrutar a conveniência de uma lista completa de palavras do Antigo e Novo Testamento em um volume de fácil manejo; e enriquecer seu estudo da Bíblia com o único dicionário expositivo completo do antigo e Novo Testamento. W. E. Vine, M.A. (1873-1949) é reconhecido como um dos principais estudiosos do grego no mundo.

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[1] Prefácio a edição Brasileira. Ronaldo Rodrigues de Souza [Diretor Executivo da CPAD] e Claudionor Corrêa de Andrade [Gerente de Publicações da CPAD]
[2] Merril F. Unger, Th.M. Th.D. Ph.D. (1909-1980)


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quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

A ABOLIÇÃO DO HOMEM [Resenha]


LEWIS, C. S. A Abolição do Homem. Rio de Janeiro, RJ: Thomas Nelson Brasil, 2017. 128p.


O AUTOR E O SEU LIVRO

Há os que consideram que este livro é o que há de melhor nos escritos de Lewis. A Abolição do Homem é, certamente, a obra de crítica ao modernismo mais conhecida de Lewis. Como o conservadorismo é, sob certos aspectos, uma reação ao modernismo e suas ideologias políticas - e era Lewis ele mesmo um conservador. 

Os capítulos são curtos e apresentam um discurso linear. Dentro de cada um tem pelo menos algumas notinhas de rodapé com nomes de livros, esclarecimentos e apontamentos. O apêndice é algo que gostei bastante. Ele traz uma lista de exemplos de fontes que estão inseridas na chamada Lei Natural, algo que o autor discorre algumas vezes durante os capítulos.

A escrita é formal, bem argumentativa e um pouco didática. Diferente de outras obras do autor, não existe necessidade de ter algum conhecimento prévio ou pesquisar palavras durante a leitura. Ele é bem objetivo e não deixa margem para dúvidas. Dificilmente você vai discordar de algum comentário, até porque o autor apenas expõe o que já sabemos (e não queremos dizer em voz alta).

A Abolição do Homem mostra um dos muitos caminhos que levam o homem a ser o que é hoje. Uma leitura instigante e transformadora que vai fazer você repensar muita coisa que acontece em nossa sociedade. C. S. Lewis dificilmente decepciona.

Delbom, escreveu: “este livro mantém uma vitalidade sólida quando a velha discussão sobre valores – ou melhor, sobre o valor dos valores – perpassa nosso cotidiano. Concordando ou não com a totalidade das posições expostas, ser tomado pelas poucas páginas deste ensaio filosófico é, inexoravelmente, ampliar a própria visão para certos perigos educacionais contemporâneos, entendendo-os dentro de uma tradição que Lewis eleva com convicção e clareza”.[1]

Lewis foi ateu por muitos anos até que, em 1929, converteu-se ao Cristianismo, passando a frequentar a Igreja Anglicana e a participar de seus ritos e cultos. Sua maior preocupação, porém, não era propagar especificamente a doutrina anglicana, mas explicar aos leitores os fundamentos do Cristianismo, fundamentos esses que Lewis entendia serem comuns a todas as denominações cristãs. Mas talvez ainda mais importante do que suas obras apologéticas sejam as contribuições de Lewis para refutar as bases do pensamento modernista, que se julga evoluído e mais inteligente em relação a seus antepassados atrasados, supersticiosos e burros. 


CAPÍTULO 1 – HOMENS SEM PEITO [2]

O primeiro capítulo deste livro é intitulado “Homens sem Peito”. E aqui C.S. Lewis inicia sua argumentação lançando uma crítica ao Livro Verde, escrito por Gaius e Titius. Trata-se de um livro de inglês, destinado a "meninos e meninas das últimas séries".[3] Na verdade, tanto o nome do livro quanto dos autores é pseudônimo, uma vez que o propósito de Lewis é criticar as ideias ali contidas, e não propriamente os autores; Lewis não quer passar a impressão de que tem algo pessoal contra eles. Aqui, Gaius e Titius citam a conhecida história de Coleridge na cachoeira. Havia dois turistas presentes: um a chamou de "sublime", e o outro, de "bonita". Dizem os autores: "Quando o homem disse Isto é sublime, ele parecia fazer um comentário sobre a cachoeira... Na verdade... ele não estava falando da cachoeira, mas dos seus próprios sentimentos. O que ele realmente disse foi Eu tenho um sentimento que minha mente associa à palavra 'Sublime'... Essa confusão está sempre presente na nossa linguagem. Aparentamos dizer algo muito importante sobre alguma coisa, e na verdade estamos apenas dizendo algo sobre nossos próprios sentimentos".

Lewis percebe nesse raciocínio, à primeira vista inofensivo, uma visão de mundo repulsiva. Dessa explicação de Gaius e Titius depreende-se que: (1) Todas as frases que contenham julgamentos de valor ('Isto é sublime' etc.) são, na verdade, expressões sobre o estado emocional de quem as emite. (2) Essas expressões não têm nenhuma importância.

Lewis critica duramente tais tentativas modernas de 'desmascarar' emoções, afirmando que (1) fazer crítica literária é difícil, já 'desmascarar' a emoção com base num lugar-comum racionalista está ao alcance de qualquer bocó e (2) a mente dos jovens, ao contrário do que se pensa, não precisa ser resguardada de supostos excessos de sensibilidade, mas, ao contrário, precisa ser "despertada do sono da fria vulgaridade".

Ao falar da educação, Lewis contrapõe a antiga à nova. A antiga tinha como objetivo abrir os olhos da pessoa para que perceba aquilo que é belo, bom, e aquilo que deve ser rejeitado. A nova procura vender, já pronta, uma visão de mundo, de acordo com o que alguns pretendem para a humanidade. Isso fica explícito no seguinte trecho: “Se eles optarem por esse caminho, a diferença entre a educação antiga e a nova será muito significativa. Enquanto a antiga promovia uma iniciação, a nova apenas “condiciona”. A antiga lidava com os alunos da mesma maneira que pássaros crescidos lidavam com os filhotes quando lhes ensinavam a voar; a nova lida com eles mais como o criador de aves lida com os jovens pássaros – fazendo deles alguma coisa com propósito que os próprios pássaros desconhecem. Em suma, a educação antiga era uma espécie de propagação – homens transmitindo a humanidade para outros homens; a nova é apenas propaganda”. [p.27]

Portanto, Gaius e Tititus, orientam que os valores não são importantes. Assim, não dão chance para os alunos formarem a própria opinião e, consequentemente, os tornam vítimas fáceis da “propaganda”.

“O dever do educador moderno não é o de derrubar florestas, mas o de irrigar desertos” [p.20]

“Discordar da frase “Isso é bonito”, se essas palavras simplesmente expressassem os sentimos de uma pessoa, seria absurdo” [p.21]

“O coração nunca toma o lugar da cabeça, mas ele pode, e deve, obedecer-lhe” [p.25]

“Produzimos homens sem peito e esperamos deles virtude e iniciativa. Caçoamos da honra e nos chocamos ao encontrar traidores entre nós. Castramos e ordenamos que os castrados sejam férteis” [p.30]

Para entender a perversão empreendida por Gaius e Titius, Lewis explica que "Até bem recentemente, os homens em geral acreditavam que o universo tinha uma natureza tal que nossas reações emocionais poderiam tanto ser congruentes como incongruentes em relação a ele - acreditavam, na verdade, que os objetos não são meros receptores, mas podem merecer nossa aprovação ou desaprovação, nossa reverência ou nosso desprezo. O homem que chamou a queda-d'água de sublime não tinha simplesmente a intenção de descrever as suas próprias emoções: ele também afirmava que o objeto merecia tais emoções" (grifos do autor). A partir daí, Lewis cita uma série de autores antigos, desde Aristóteles e Platão até Santo Agostinho, lembrando que a educação tradicional por eles sugerida, ao contrário de 'desmascarar' emoções, era precisamente treinar o jovem a sentir prazer, repulsa e ódio em relação às coisas que realmente são prazerosas, repulsivas e odiáveis.

“Cada instinto, se o ouvirmos atentamente, clamará por ser atendido à custa de todos os outros. Pelo simples fato de ouvirmos um deles e não os demais, estaremos fazendo um julgamento prévio da questão.” [p.40]

“A capacidade da mente humana para inventar novos valores não é maior do que a de imaginar uma nova cor primária, ou, na verdade, a de criar um novo sol e um novo céu no qual ele se mova.” [p.46]

“A conquista da Natureza pelo Homem, caso se realizem os sonhos de alguns cientistas planejadores, significaria que algumas centenas de homens estariam governando os destinos de bilhões e bilhões.” [p.59]

“A conquista final do homem mostrou-se a abolição do Homem.” [p.66]

Por que “Homens sem Peito?” Essa expressão foi inspirada em Alanus ab Insulis, segundo o qual a cabeça domina o estômago por meio do peito - que é o trono das emoções transformadas em sentimentos estáveis pelo hábito treinado. A cabeça é a razão, o peito os sentimentos estáveis e o estômago as emoções viscerais, desmedidas, irrazoáveis. Não é sem espanto constatarmos que, atualmente, pessoas assim são chamadas de "intelectuais". Lewis afirma, com um leve toque irônico, que "Suas cabeças não são maiores que as comuns: é a atrofia do peito logo abaixo que faz com que pareçam assim".


CAPÍTULO 2 – O CAMINHO [4]

O segundo capítulo é a apresentação dos caminhos para onde essas duas cosmovisões nos levariam. A falta de apreço pela moral tradicional conduziria a humanidade a própria decadência e extinção, não exatamente no sentido físicomaterial, mas no sentido moral e, de maneira tácita, espiritual. O segundo capítulo é a ponte para o terceiro onde ele falará da busca incessante pela conquista da natureza humana, transformando-a em um mero objeto de investigação científica que conduzirá para fora daquilo que nos torna intrinsicamente humanos. 

Lewis mostra que essa conquista, além de falsa, é inversa: é a Natureza que está conquistando o Homem. Todas as invenções, todos os "avanços" e "progressos", não representam o poder do Homem sobre a Natureza, mas o poder de alguns homens sobre o resto dos homens com a Natureza como instrumento. Avião, rádio, internet: não se pode dizer que estamos conquistando a Natureza com eles. Afinal, o Homem é tanto sujeito quanto objeto de tal poder: aviões são bons, mas não quando nos jogam bombas na cabeça; o rádio é bom, mas não quando terroristas o usam para intercomunicarem-se; a internet é boa, mas não quando é usada por Manipuladores para vasculhar nossa intimidade.

O que se quer dizer com isso é que essas invenções, muito além de apenas nos trazerem confortos e divertimentos, trazem em si o acúmulo cada vez maior de poder nas mãos de alguns poucos homens, à medida que a modernidade "avança". Lewis nos propõe um exercício de imaginação: como será o século C d.C.? Como estaremos vivendo lá pelo ano 10.000 d.C.? Quanto mais o tempo passa, cada vez menos homens têm cada vez mais poder em suas mãos. "Os últimos homens, longe de serem os herdeiros do poder, serão os que mais estarão sujeitos à mão mortal dos grandes Planejadores e Manipuladores, e serão os menos capazes de exercer algum poder sobre o futuro. Cada novo poder conquistado pelo homem é da mesma forma um poder sobre o homem. Cada avanço o deixa mais fraco, ao mesmo tempo que mais forte. O último estágio virá quando, mediante a eugenia, a manipulação pré-natal e uma educação e propaganda baseadas numa perfeita psicologia aplicada, o Homem alcançar um completo domínio sobre si mesmo. A natureza humana será a última parte da Natureza a se render ante o Homem".

Estes homens do futuro não serão homens: serão artefatos. "A conquista final do homem mostrou-se a abolição do Homem". A raça humana estará sujeita a alguns poucos indivíduos que, por sua vez, estarão sujeitos àquilo que neles mesmos é puramente "natural" - aos seus impulsos irracionais. A Natureza controla os Manipuladores, vencendo-os, em vez deles a vencerem.

Todas as coisas estarão reduzidas à mera condição de Natureza com o propósito, vejam vocês, de "conquistá-las". Isso tudo porque, estando fora do Tao, nossos valores resumem-se a impulsos e gostos. Lewis nos explica que "quando compreendemos uma coisa analiticamente e a dominamos e usamos para a nossa própria conveniência, nós a reduzimos à condição de 'Natureza'...e a tratamos quantitativamente. Realiza-se a supressão de certos elementos, impedindo que tenhamos uma percepção completa do objeto. As estrelas perderam seu aspecto divino conforme a astronomia se desenvolveu, e o Deus Morto não tem nenhuma função na agricultura da era química. As grandes mentes sabem muito bem que o objeto, tratado dessa forma [analítica], não passa de uma abstração artificial, e que com esse processo algo da sua realidade foi perdido".

A esse processo no qual o Homem cede cada vez mais objetos e, finalmente, a si próprio, em busca de poder, Lewis chamada de "oferta de bruxo". Uma expressão certamente surpreendente, uma vez que a nós parece que ciência aplicada e bruxaria situam-se em pólos opostos. Lewis explica, porém, que "Existe algo que une a bruxaria e a ciência aplicada ao mesmo tempo que se separa da 'sabedoria' dos tempos antigos. Para os sábios da antiguidade, o problema principal era como conformar a alma à realidade, e a solução encontrada foi o conhecimento, a autodisciplina e a virtude. Tanto para a bruxaria quanto para a ciência aplicada, o problema é como subjugar a realidade aos desejos dos homens, e a solução encontrada foi uma técnica; e ambas, ao praticarem essa técnica, se põem a fazer coisas até então consideradas repulsivas e impiedosas - tais como desenterrar e retalhar cadáveres".

A solução para esse terrível problema? Lewis até mesmo imagina e cogita uma "ciência regenerada", uma ciência que, ao tentar explicar algo, não abolisse esse algo, adquirindo o conhecimento por um preço mais módico do que a vida. Mas a tarefa de efetivamente propor um plano que reverta ou neutralize a ciência moderna parece estar acima da capacidade de Lewis, que admite nem mesmo saber exatamente o quê está pedindo com essa "ciência regenerada".


CAPÍTULO 3 – A ABOLIÇÃO DO HOMEM [5]

Chegamos ao terceiro e último capítulo, que tem o mesmo título do livro, e cuja premissa é a seguinte: tentando dominar a natureza tão completamente a ponto de dominar até a própria natureza humana, o homem se fundiria à própria natureza, causando a abolição do Homem, isto é, do ser humano como o conhecemos, com as características que o fazem humano, diferenciado dos animais.

A progressão lógica desse capítulo é muito interessante. O autor demonstra que dizer que o homem domina a natureza não é exatamente verdade. Ele pega três exemplos de elementos que eram vitórias do homem sobre a natureza na época (avião, rádio e anticoncepcionais) e mostra que, em última instância, esses avanços são a vitória somente de alguns homens (só os que podem pagar, que podem produzir, determinar ou proibir a produção e distribuição, etc) sobre a natureza, e, além disso, não é tanto a natureza que está sendo dominada, mas sim foi convertida em meio para alguns homens exercerem poder sobre os outros. Ele mostra que isso é uma constante: mesmo que houvesse apenas um Estado e este fosse baseado no governo em favor da maioria, o “domínio da natureza” seria usado para o exercício de poder da maioria sobre as minorias, e, num outro nível, poder de um governo (minoria) sobre a totalidade do povo (maioria).

No que toca especialmente ao exemplo dos anticoncepcionais, segundo Lewis, a dominação de uns seres humanos por outros ocorre em outro plano, num plano temporal ou geracional, em que as gerações anteriores exercem controle sobre as futuras. Partindo desse gancho, ele entra num momento especulativo, quase distópico, do seu raciocínio, e menciona a eugenia, referindo os conflitos geracionais e apontando que a geração mais “forte” ou com mais domínio sobre a natureza seria — pela lógica desmistificadora — aquela que estivesse mais desprendida do Tao, isto é, que mais resistisse às gerações passadas, e que tivesse mais poder sobre as gerações futuras, aquele poder sobre a consciência ou sobre a própria “natureza humana”. Em seguida ele demonstra que, numa reviravolta bizarra, essas pessoas, despidas de valores como “o bem da posteridade” ou “a felicidade geral” — pois se os tivessem, ainda não seriam a última geração, aquela que se livrou completamente do Tao — só poderiam ser governadas pelos próprios impulsos que, em si mesmos, não carregam valores de bons ou ruins, apenas existem. Sem critério para ordená-los esses impulsos seriam exercidos ao arbítrio da vontade individual da minoria que estaria no poder então — a quem o autor denomina como “os Manipuladores” — ou seja, ao sabor das flutuações de suas inclinações naturais.

Assim, no momento supremo da vitória do Homem sobre a natureza, a natureza teria vencido o Homem, abolindo-o com tudo o que lhe era próprio.


APÊNDICE – EXEMPLOS DO TAO

É no primeiro capítulo que Lewis introduz a noção de Tao, que apesar de ter origem no pensamento chinês, o autor utiliza para embarcar tudo aquilo que é verdadeiro, aquilo que é comum a todos. Um primeiro contato com esse termo é importante para entender o que se segue nos próximos capítulos. No Tao está aquilo que é correto e aquilo que não, independente do pensamento a que se recorra: platônico, cristão, aristotélico, oriental, estoico. A atribuição de um valor objetivo às coisas, ações. É importantíssimo para entender a defesa de valores universais, já que no Tao tudo está contido.

C.S. Lewis faz uma incursão em diversas culturas, em seus textos ancestrais, para demonstrar que podemos encontrar em todas elas alguns valores comuns, o que demonstraria que tais valores não são oriundos da cultura, relativos a certo grupo em certo lugar e em um dado tempo. Nesse sentido, remontando a textos que vão desde o Livro dos Mortos (Egípcio antigo), passando pelo Nórdico Antigo, pelo Babilônio, pelo Hindu, pelo Chinês, pelo Judaísmo, pelas tradições Grega, Estoica, Romana, etc., ele logra demonstrar que em todas elas algumas “virtudes” simplesmente brotaram da natureza humana mesma. Caridade, deveres em relação aos pais e aos mais velhos, justiça, veracidade/honestidade, magnanimidade, entre outras, seriam virtudes que surgiram “desde o interior do homem”, não de seu entorno.


CONCLUSÃO

Depois de escrever como escreveu, Lewis prevendo que o chamarão de obscurantista, antiquado e contrário ao progresso científico, por seu posicionamento. Embora entristecendo-se pela acusação que considera inverídica, termina o livro com uma crítica à ciência — ou antes, à ciência utilitária, que viola todo tipo de limite não em busca de conhecer a realidade, mas de curvá-la à sua vontade. Apesar de reconhecer seu uso positivo para muitas coisas (como os avanços medicinais), ele aponta uma origem arrogante na ciência e a chama a um “ato de contrição”, fazendo um apelo por algo que ele mesmo reconhece que pode ser inatingível: uma ciência que busque compreender e explicar a realidade, sem desfigurá-la.

Portanto[6], a Abolição do homem é um daqueles livros que longe de clichés ou de palavras fáceis te leva a pensar e a tentar entender o que o autor quer dizer. Lewis procura mostrar que ao dominar a Natureza e impor a sua vontade, o Homem acaba por se anular, e consequentemente a se distanciar daquilo que ele denomina como Tao. Para quem está habituado a ler as Crônicas de Nárnia, do mesmo autor, verá nesta obra um raciocínio exuberante, mas que depende do conhecimento de quem lê, da obra na qual Lewis se baseia ao escrevê-lo. Por isso, as vezes tem-se a sensação de que falta um conhecimento maior por parte do leitor às argumentações que Lewis faz. Deveras para o público de sua época, facilmente identificaria a qual livro em questão ele se referia ao fazer suas críticas mais contundentes. Nos falta esse conhecimento portanto.

Não de menos, ler A Abolição do Homem provocará no leitor a busca de um melhor entendimento do que vem a ser o Tao, assim como proporcionará uma maneira diferente de ver as relações de poder entre dominadores e dominados, entre o Homem e a Natureza, para além daquilo que nossos olhos vêem.

Livro publicado pela Thomas Nelson Brasil.
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Para ler outros livros desta coleção de C. S. Lewis, clique na imagem


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[1] DELBON, Anthonio. A Abolição do Homem. Disponível em https://goo.gl/TJC33E Acesso em 07 fev 2019.
[2] ARBUSTO, J. A Abolição do Homem e o triunfo da natureza. Disponível em https://goo.gl/htuLkL Acesso em 06 fev. 2019
[3] O Livro Verde em questão trata-se O Controle da Linguagem: uma abordagem crítica à Leitura e Escrita, de Alec Rei e Martin Ketley, publicado em 1939, segundo Benjamin Wiker – o escritor logo derrama sua acidez em uma pedagogia relativista que trata com um ceticismo tão extremo qualquer valor objetivo que acaba por incutir um pressuposto na cabeça dos jovens alunos: qualquer lei natural, Verdade objetiva, com esse V maiúsculo, qualquer essência moral, tudo isso não passa de pura balela. “Castramos e ordenamos que os castrados sejam férteis” [p.30]
[4] ARBUSTO, J. A Abolição do Homem e o triunfo da natureza. Disponível em https://goo.gl/htuLkL Acesso em 06 fev. 2019
[5] BATISTA, E. A Abolição do Homem. Disponível em https://goo.gl/7uUEgn Acesso em 06 fev. 2019.
[6] AMARANTE, Claudia. A Abolição do Homem – Uma Resenha. Disponível em https://goo.gl/Eqwyr6 Acesso em 07 fev 2019.

sábado, 2 de fevereiro de 2019

PEDRO - O PRIMEIRO PREGADOR PENTECOSTAL [Resenha]


ZIBORDI, Ciro Sanches. Pedro, o primeiro pregador pentecostal. Rio de Janeiro, RJ: 2018. 240p. 


Este livro é o terceiro de uma série de 7 livros, intitulado “Pregadores da Bíblia”, que tem como objetivo fazer uma análise da pregação contemporânea, dando destaque para os acertos do pregador bem-sucedido, isto é, aquele que tem compromisso com a palavra de Deus e com o Deus da Palavra. Nesse caso visando uma abordagem positiva, o autor selecionou sete pregadores neotestamentários aprovados por Deus, a fim de discorrer sobre as suas principais características. Os setes personagens são: João Batista, Jesus Cristo, Pedro, Estevão, Filipe, Barnabé e Paulo. 

O Livro além do prefácio e introdução, possui 7 capítulos que como escreveu o próprio autor – “um texto de leitura rápida, bem humorada e estimulante, que incentive o leitor a continuar lendo” [p.8]. Contudo, o conteúdo é sério com muita abordagem teológica. 

Este livro trata-se muito mais do que uma biografia do apóstolo Pedro, mas, o autor defende desde a introdução até o último capítulo, uma fundamentação bíblica teológica do movimento pentecostal. “Entretanto, nesta obra, defendo a ideia de que, a partir do derramamento do Espírito Santo, naquele dia [o de Pentecostes], a comunidade daqueles primeiros anos foi chamada, com muita propriedade. Igreja Pentecostal”. [p.17] 

Em seguida temos uma pequena introdução acerca da vida daquela que será discutido em todo o livro: Simão Barjonas era um simples pescador no lago de Genesaré (Lc 5.10). Ele e seu irmão, André, criam em Deus, mas o segundo aparentava estar mais interessado em conhecer a vontade do Senhor. E, por isso, foi até a Judeia para ouvir a dura pregação de João Batista, um pregador que o chamaríamos hoje de "politicamente incorreto" (Jo 1.35-42). André repassava a Pedro tudo o que ouvia, até que ambos conheceram o Salvador do mundo, por indicação do próprio Batista (Jo 1.35-42). Um dos quatro primeiros discípulos de Jesus e o primeiro apóstolo dentre os Doze (Lc 5.1-11), Simão era casado, e sua sogra — que seria, um dia, curada por Jesus — vivia na cidade de Cafarnaum. 

Sua esposa e ele foram morar ali, possivelmente, algum tempo depois de casarem (cf. Mt 8.14; Mc 1.29; Lc 4.38). Ao contrário do seu companheiro João, Simão Pedro tinha um caráter decidido e impulsivo. Ele estava disposto a matar e morrer ao defender suas idéias (Jo 18.10). Por outro lado, muitas vezes mostrou-se medroso, ingênuo, porém muito sincero, a ponto de arrepender-se com lágrimas amargamente (Mt 26.75). 

E assim conclui a introdução desta obra: Portanto, o primeiro pregador pentecostal não foi John Wesley. O pentecostalismo não deriva do movimento holiness, O Movimento Pentecostal, originalmente, não foi propagado pelo Avivamento da Rua Azusa. O que houve ali foi um reavivamento, pois tudo começou no dia de Pentecostes em Jerusalém! Convido, pois, o prezado leitor a conhecer o primeiro pregador pentecostal: o pescador, discípulo de Jesus, apostolo e autor de epístolas — papa, não! — Simão Pedro. 


CAPÍTULO 1 – PROVADO PELA ÁGUA 

Depois de trabalhar de forma bem humorada uma entrevista imaginária com Simão Pedro, o autor faz um levantamento biográfico-bíblico da do apostolo Pedro, começando pelo sua conversão, chamada e experiências. Apesar de ter um histórico de altos e baixos, é destacado aqui a sua capacidade de liderança e munido de uma personalidade forte 

A trajetória de Pedro começou, de fato, junto ao lago de Genesaré, depois daquela pesca maravilhosa, quando Jesus confirmou a chamada de Pedro, em especial, dizendo-lhe: "Não temas; doravante serás pescador de homens" (Lc 5.10). Mais tarde, em Cesareia de Filipe, Pedro viveu outro momento significativo como principal dos Doze. Jesus perguntou a eles: [...] Quem dizem os homens que eu sou?" (Mc 8.27)- Diante de respostas variadas, o Mestre fez outro questionamento: "Mas vós quem dizeis que eu sou?". Pedro, respondeu: "[...] Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo" (Mt 16.16). Foi neste momento que o Senhor disse a ele: "[...] Bem-aventurado és, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue que to revelaram, mas meu Pai, que está nos céus. Também eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela"(Mt 16.17,18, ARA). 

Deus já tinha um plano traçado para a vida de Pedro até seu martírio. Mas, para que essa linda trajetória começasse, Simão, o pescador, devia entregar-se, de fato, a Cristo. Pedro, antes de conhecer o Salvador, ouviu primeiro a mensagem de João Batista, o precursor de Cristo. A mensagem chegou a ele por meio de seu irmão, André, que, aparentemente, estava mais interessado em conhecer a quem batizaria seus discípulos com o Espírito Santo e com fogo (Jo 1.29-42; Mt 3.11). Pedro foi levado a Cristo por André, seu irmão. Este não guardou para si a boa notícia que recebera, mas achou primeiro a seu irmão Simão e disse-lhe: Achamos o Messias (que, traduzido, é o Cristo). E levou-o a Jesus (Jo 1.41.42). Pedro tornar-se-ia o primeiro dentre todos os Doze. Ao chegar diante do Mestre, houve uma troca de olhares, e Ele, de imediato, disse-lhe o que aconteceria a partir daquele momento: "[...] Tu és Simão, filho de Jonas; tu serás chamado Cefas (que quer dizer Pedro)" (Jo 1.42). Mateus e Marcos registram um segundo encontro de Pedro e André com Jesus, também na Galileia. O primeiro, intermediado por André, foi na própria casa de Jesus. O segundo, às margens do lago-mar da Galileia. 

Para o autor, acredita-se que "Pedro recebeu três chamadas distintas de seu Mestre, a primeira para ser discípulo; a segunda, para acompanhá-lo em sua missão; e a terceira para ser apóstolo". Essa segunda chamada, no entanto, não era, ainda, para ser um pescador de homens, e sim para aprender a sê-lo; ela diz respeito ao futuro: "vos farei pescadores de homens" (Mt 4.19). Pedro, então, passou por esse período de aprendizagem, e o Senhor disse-lhe, em outra ocasião, dessa vez individualmente: "de agora em diante, serás pescador de homens" (Lc 5.10). 

Por que o autor deu a este capítulo o título de “provado pela água”? A resposta está aqui: Jesus elegeu homens limitados, boa parte deles pescadores. A escolha do colégio apostólico é surpreendente. Pedro tornou-se pregador do evangelho e, em seguida, o principal apóstolo. Todavia, ele e todos os seus companheiros eram testados o tempo todo. As provas de Pedro quase sempre estavam relacionadas com o mar da Galileia, que ele pensava conhecer e dominar. Quando foi chamado para ser pescador de homens, estava ali. Mais tarde, teve seu chamamento confirmado no mesmo local. O primeiro grande teste de Pedro no mar da Galileia foi em meio à famosa pesca maravilhosa, na qual o Senhor confirmou sua chamada para pregar o evangelho (Lc 5.1-11). O segundo foi durante uma grande tempestade, quando ele ja fazia parte do grupo seleto dos Doze (Mc 4.35-41). O terceiro foi logo "após a primeira multiplicação de pães, quando andou por cima do mar (Mt 14.22-36). E o quarto foi quando o Senhor, já ressuscitado, teve uma longa conversa com esse apóstolo logo após outra maravilhosa pescaria (Jo 21.1-23). [p.21-47] 


CAPÍTULO 2 – PREGADOR, APÓSTOLO... PAPA NÃO! 

Este capítulo, depois de descrever todo o treinamento dos doze, dos três e de Pedro para a grande missão para o qual Deus o chamava para ser pregador e apóstolo, conclui de forma apologética afirmando PAPA NÃO! 

Mateus informa que, "chegando Jesus às partes de Cesareia de Filipe, interrogou os seus discípulos, dizendo: Quem dizem os homens ser o Filho do Homem?" (16.13; cf. Mc 8.27). Alguns leitores da Bíblia poderão pensar que o Senhor Jesus estava preocupado com a sua popularidade quando perguntou a Pedro e a seus companheiros sobre o que as pessoas diziam a seu respeito. Lucas, porém, informa que, antes de fazer essa pergunta, Ele estava "orando em particular" (Lc 9.18). O que Ele desejava, de faro, era submeter os Doze — especialmente os Três e, mais especificamente, Pedro - a mais uma prova. O Mestre sempre soube que o mais importante não era a opinião das pessoas a seu respeito, e sim o testemunho do Pai celestial, que já dissera em seu batismo em água: "Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo" (Mt 3.17). 

Mais um momento decisivo para Pedro, pois sua resposta poderá ensejar o início de um novo capítulo de sua nova vida com Cristo. A pergunta entrou pelos ouvidos de Pedro: "E vós, quem dizeis que eu sou?" (Mt 16.15). Ele não era do tipo que esperava para dar a resposta; parecia estar sempre numa competição em que precisasse ser o primeiro a responder, mesmo que a resposta não fosse a esperada. Ele, contudo, acabara de receber uma revelação do Pai celestial. E, com toda a convicção, respondeu olhando firmemente para o Mestre: "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo" (v. 16). Naquele momento, Pedro tinha plena certeza de que Jesus é o Messias, o Verbo de Deus encarnado. Não foi uma resposta dada por impulso. Pedro realmente estava em sintonia com o Pai celestial. Por isso, o Senhor respondeu-lhe: "Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque não foi carne e sangue quem to revelou, mas meu Pai, que está nos céus" (Mt 16.17). 

O Senhor, então, disse ao primeiro dos Doze e dos Três: "também eu te digo que tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha igreja, e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. E eu te darei as chaves do Reino dos céus, e tudo o que ligares na terra será ligado nos céus, e tudo o que desligares na terra será desligado nos céus" (Mt 16.18,19). A partir desse momento, além de pregador e apóstolo, Pedro passou a ser... o quê mesmo? Papa? Fundamento da Igreja? Bem, essa declaração do Senhor a respeito de Pedro e da Igreja merece uma explicação detalhada. 

Para o romanismo, Pedro foi mais que líder ou representante dos Doze no começo da igreja em Jerusalém; ele é a pedra fundamental, a rocha sobre a qual Cristo edificou a sua Igreja. E tem mais: como a ele foi dado o poder de abrir a porta do Reino dos céus, toda autoridade foi-lhe conferida até nossos dias mediante sua linhagem. Entretanto, consta que, dos 266 "vigários de Cristo" (de Pedro a Francisco), "30 deles não foram exemplos para a Igreja Católica (...] e 202 figuram como meros administradores dos bens da Santa Sé" (MENDES, p. xv). 

O que, de fato, o Senhor Jesus quis dizer quando respondeu ao testemunho de Pedro? De modo geral, desde os primórdios do cristianismo, há quatro opiniões sobre o que está escrito em Mateus 16.18. Três delas, evangélicas, são convergentes e harmonizam-se entre si. Comecemos pela romanista, que, a rigor, é a única que precisa ser refutada. 

A partir daqui, o autor formula duas perguntas e dar suas respectivas perguntas: As perguntas são: por que Pedro não foi o primeiro papa e por que Pedro não é o fundamento da igreja? Depois de responder de forma bíblico-teológica ele agora dá três respostas opinião romanista, São elas: (1) "esta pedra” Refere-se a Jesus Cristo. (2) "esta pedra” diz Respeito à Grande Confissão de Pedro (3) "esta pedra” alude a Cristo e os Apóstolos. Conclui esse capítulo afirmando que Cristo é a Pedra, o fundamento da Igreja. Nós somos pequenos blocos, pedras, sendo edificadas sobre essa grande Rocha (1 Pe 2.4,5). Pedro, uma dessas pedras pequenas, foi o nosso representante, por meio de quem nós, pregadores do evangelho, recebemos "as chaves do Reino dos céus". Grande é a nossa responsabilidade! [p.49-76] 


CAPÍTULO 3 – TREINAMENTO DE PEDRO 

O autor começa esse capítulo de onde terminou o anterior, dizendo que Jesus ficou muito satisfeito com a confissão de Pedro em Cesareia de Filipe e fez questão de dizer-lhe que suas palavras resultaram de uma revelação do Pai celestial, e não de impulsividade carnal (Mt 16.13-19). Neste capitulo, no entanto, conheceremos o "outro lado da moeda", pelo qual fica evidente, a luz da Psicologia, que esse apostolo tinha, de fato, uma língua impulsiva, advinda de seu temperamento sanguíneo. 

O caso em pauta aqui agora é aquela cena que o autor denomina de “Do céu ao inferno”. Vamos ao caso. Jesus ficou satisfeito com a confissão de Pedro, pois este, como líder entre os Doze, já havia entendido que Ele é o Cristo, o Filho de Deus e o Salvador do mundo. No entanto, como ainda não chegara o tempo de isso ser propagado sem nenhuma restrição, uma vez que o Senhor ainda haveria de morrer por nossos pecados e ressuscitar para nossa justificação, "mandou aos seus discípulos que a ninguém dissessem que ele era o Cristo" (Mt 16.20). Logo após a declaração de Pedro, começou "a mostrar aos seus discípulos que convinha ir a Jerusalém, e padecer muito dos anciãos, e dos principais dos sacerdotes, e dos escribas, e ser morto, e ressuscitar ao terceiro dia" (Mt 16.21). Jesus expôs-lhes, na verdade, todo o plano salvífico previsto nas Escrituras, que começou com a sua encarnação, passaria pela cruz e culminaria com a ressurreição (Is 53; SI 16; 1 Co 15.1-4). Agindo como um neófito, Pedro chamou o Senhor Jesus para uma conversa reservada, a fim de convencê-lo a desistir da cruz. Momentos depois de receber uma revelação celestial, deixou-se influenciar pelo Inimigo, indo do "céu" ao "inferno". Marcos informa que o Senhor, "virando-se e olhando para os seus discípulos, repreendeu a Pedro, dizendo: Retira-te de diante de mim, Satanás; porque não compreendes as coisas que são de Deus, mas as que são dos homens" (8.33). Essa não foi a primeira vez em que o Diabo tentou atrapalhar o plano divino para salvar os pecadores. Após essa dura repreensão, o Senhor aproveitou para ensinar Pedro e seus companheiros a respeito da vida de renúncia e sofrimento (Mt  16.24-28). 

Temos ainda neste capítulo três outros assuntos bem colocados pelo autor. Tais assuntos não foram inseridos neste capítulo de forma aleatória ou proposital, mas, posso afirmar que fizeram parte do treinamento de Pedro: Oração no monte, a teologia da Transfiguração e aquele tema que o autor definiu como “modismo” – cair no espírito. 

Voltando ao “Treinamento de Pedro” o autor afirma que Na medida em que Jesus aproxima-se da cruz, Pedro distancia-se dEle até negá-lo diante dos homens. A despeito de todos os ensinamentos que ouviu e das experiências que vivenciou, esse apóstolo ainda não era convertido. Por isso, momentos antes de ser preso, o Senhor disse-lhe: "Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou para vos peneirar como trigo! Eu, porém, roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça; tu, pois, quando te converteres, fortalece os teus irmãos" (Lc 22.31,32, ARA). Ele só se converterá, de fato, após a ressurreição do Senhor (Jo 21.17). E, então, como ensinou Paulo, "[...] o véu se tirará" (2 Co 3.16), e Pedro passará a entender: [...] que não foi com coisas corruptíveis, como prata ou ouro, que fostes resgatados da vossa vá maneira de viver que, por tradição, recebestes de vossos pais, mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado (1 Pe 1.18,19). 

Convertido, de fato, e cheio do Espírito Santo após a descida do Paráclito no dia de Pentecostes, Pedro fará um grande trabalho para Deus, inicialmente como líder e pregador da Igreja Primitiva. Isso é assunto para os próximos capítulos desta obra, em que, acompanhando a linha do tempo desse apóstolo, vamos conhecer detalhes sobre sua queda, seu recomeço após a ressurreição de Jesus, bem como seu ministério como primeiro pregador pentecostal. [p.77-100] 


CAPÍTULO 4 – ASSENTADO PARA VER O FIM 

Neste capítulo, embora o autor tenha focado alguns assuntos polêmicos, como por exemplo: o caso de Judas (predestinado ou não) e questões escatológicas dentro de sua visão, o que me deterei na verdade são três assuntos aqui tratados, que segundo o autor são parte integrantes do treinamento ministrado especificamente ao Três. 

Escatologia - Tudo o que lhes ensinou sobre os eventos escatológicos será útil especialmente a Pedro e João, que, no fim de suas vidas – com uma compreensão bem mais ampla do futuro glorioso da Igreja -, vão tratar de questões apocalípticas em seus escritos. Como nós entenderíamos 2 Pedro 3 e o livro de Apocalipse se o Mestre não nos tivesse deixado essa maravilhosa exposição sobre as últimas coisas? Há que se notar ainda que, embora o Senhor não se tenha preocupado com a ordem dos acontecimentos futuros — o que é comum no gênero apocalíptico —, pode-se estabelecê-la, à luz da analogia geral da Bíblia. Tomando-se como base Mateus 24 e 25, Lucas 21.5-36 e Marcos 13, quais são os principais assuntos contidos no Sermão Profético? Os assuntos do Sermão Profético são: Invasão de Jerusalém, Sinais gerais, Predições e advertências para Israel sobre a Grande tribulação, manifestação do Senhor, Arrebatamento da Igreja, Tribunal de cristo e julgamento das nações. 

Humildade - aproveitando que alguns retomaram aquela discussão pueril sobre quem era o maior - disse-lhes, mais uma vez, que o maior aqui será o menor ali (Lc  22.24-28), encerrando o assunto com uma promessa: "eu vos destino o Reino, como meu Pai mo destinou, para que comais e bebais a minha mesa no meu Reino e vos assenteis sobre tronos, julgando as doze tribos de Israel" (w. 29,30; cf. Jo 13.16,17). O Senhor levantou-se - eles estavam assentados no chão; possivelmente, ao redor de uma plataforma baixa — e surpreendeu-os com uma grande lição de humildade. Tirando suas vestes e enrolando-se numa toalha, pôs agua em uma bacia e começou a lavar os pés de cada um dos apóstolos e enxuga-los (vv. 3-5). Querendo demonstrar respeito ao Mestre, Pedro reagiu: "Senhor, tu lavas-me os pés a mim? Jo 13.6). E Ele respondeu-lhe: "O que eu faço, não o sabes tu, agora, mas tu o saberás depois" (v. 7). No entanto, assim como João Batista, que relutava em batizar Jesus em água, Pedro insistiu: "Nunca me lavarás os pés" (v. 8). Era como se dissesse: "Eu e que preciso lavar os teus pés, e tu vens a mim?" (cf. Mt 3.l4). Jesus sabia como lidar com Pedro; as vezes, ele precisava de um “tratamento de choque" para entender os ensinamentos. Assim, ante sua resistência, o Mestre foi mais incisivo: "Se eu te não lavar, não tens parte comigo" (Jo 13.8). E o homem impulsivo que, há, poucos segundos, não queria permitir que seus pés fossem lavados, agora quer um banho quase completo: "Senhor, não só os meus pés, mas também as mãos e a cabeça" (v. 9). O raciocínio dele pode ter sido o seguinte: "Se o Mestre lavar cabeça, mãos e pés, além de ter comunhão com Ele, receberei várias bênçãos e serei um ótimo líder". O Senhor, porém, tinha outra lição em mente e logo mostrou a Pedro que todos os apóstolos já estavam limpos pela Palavra, exceto um, que escolhera traí-lo (Jo 13.10,11; 15.3). E, assim que lavou os pés de todos — inclusive o do traidor —, voltou a assentar-se à mesa para explicar-lhes o que significava esse ato: “Vós me chamais Mestre e Senhor e dizeis bem, porque eu o sou. Ora, se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os pés, vós deveis também lavar os pés uns aos outros. Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também” (13.13-15). 

A negação de Pedro – A partir da prisão do Senhor, Pedro, literalmente, passou a segui-lo de longe (Lc 22.54). Talvez ele tenha-se decepcionado, já que as perguntas sobre o futuro que ele e seus companheiros fizeram a Jesus (Mt 24.3), inclusive depois de sua ressurreição (At 1.6), indicam que eles esperavam que o Messias fosse um libertador político, alguém que restaurasse o reino a Israel. Pedro só vai entender plenamente o que é o Reino de Deus depois da ascensão de Jesus e a manifestação do Espírito Santo. Mesmo depois da ressurreição do Senhor, vemo-lo, ainda, "assentado", por assim dizer. O momento da virada de página para esse apóstolo será a descida do Paráclito no dia de Pentecostes, dez dias após o Senhor ter sido recebido "em cima no céu" (cf. At 1.7-15; 2.14). Entretanto, assim que fugiu do Getsêmani, sua vida foi de mal a pior. Ele desceu vários degraus em pouco tempo. Ao ser preso, Jesus foi inicialmente levado para a casa do sumo sacerdote sob o olhar de Pedro, que, escondido, acompanhava tudo de longe. Sabemos que este, apesar de ser o líder entre os Doze, não podia fazer nada para livrar o Senhor, que veio para morrer pela humanidade e ser "o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo" (Jo 1.29). Esse apóstolo, entretanto, não esperava que sua lealdade fosse provada tão cedo. Ao aproximar-se de onde Jesus estava, Pedro, literalmente, assentou-se a roda dos escarnecedores (cf. SI 1.1). Lucas diz que, "havendo-se acendido fogo no meio do pátio, estando todos sentados, assentou-se Pedro entre eles" (Lc 22.53). Naquela mesma noite, ele desceria quatro degraus: Negação, mentira, Juramento e Maledicência. Mateus apresenta, togo após o choro amargo do arrependimento de Pedro (26.75). Pedro sai de cena enquanto os evangelistas narram o julgamento, a crucificação e a ressurreição do Senhor. Ele reaparece quando Maria Madalena dá-lhe a notícia de que, ao visitar o túmulo de Jesus no domingo, de madrugada, encontrou a pedra removida (Jo 20.1). Ela, sem perda de tempo, deu a notícia aos apóstolos Pedro e João. Mas, o autor mostra que Pedro teve um recomeço especial, aquele mesmo que, havia pouco tempo, pusera tudo a perder quando negou a Jesus mentindo, jurando e praguejando. Louvado seja Deus, que transforma o fim em novo começo! [p.101-126] 


CAPÍTULO 5 – EM PÉ PARA UM NOVO COMEÇO 

Como em todos os capítulos, é sempre colocado pelo autor uma série de temas que não somente – alguns deles – foram usados para o treinamento dos Três, mas, que também servem de treinamento e instrução daqueles que leem este livro. Por exemplo – uma cronologia das aparições de Jesus Ressurreto. Mas, o ápice deste capítulo é a forma como Jesus proporcionou um novo começo para Pedro. 

O amor de Jesus por Pedro era tão grande que a mensagem do anjo às mulheres que encontraram a pedra do sepulcro removida foi a seguinte: "ide, dizei a seus discípulos e a Pedro que ele vai adiante de vós para a Galileia; ali o vereis, como ele vos disse" (Mc 16.7). Os Onze deveriam ser avisados de que o Senhor ressuscitara, mas Ele fez questão de ordenar ao anjo que desse a Pedro um aviso especial. Isso porque a essa altura Pedro não se sentia mais discípulo. Pedro imaginou que não havia mais chance para ele. Pedro se sentiu indigno. Pedro desistiu de tudo, mas Jesus não desistiu de Pedro." 

Poucos dias após sua ressurreição, o Senhor surpreendeu a Pedro e a mais seis discípulos em uma pescaria "junto ao mar de Tiberíades", outro nome para o mar da Galileia (Jo 21.1). A pescaria estava sendo decepcionante, pois "naquela noite nada apanharam" (Jo 21.3). E possível que Pedro tenha lembrado, saudoso, da pesca maravilhosa, quando sua chamada para ser pescador de homens foi confirmada (Lc 5.1-11). Porém, pela manhã, "Jesus se apresentou na praia" (Jo 21.4), não como outrora. Não mais sujeito às leis da natureza, Ele não se deu a conhecer a todos. Era um momento de transição. Em breve, Ele deixaria seus discípulos definitivamente aos cuidados do Espírito Santo. Ele aproximou-se de Pedro e seus companheiros, mas eles "não conheceram que era Jesus" (Jo 21.4). Em seguida, perguntou-lhes: "Filhos, tendes alguma coisa de comer?" (v. 5). E, ante a negativa deles, o Senhor ordenou-lhes que lançassem a rede à direita da embarcação. Quando fizeram isso, sentiram a rede pesada e "não a podiam tirar, pela multidão dos peixes" (v. 6). Todavia, quem primeiro reconheceu o Mestre foi exatamente "aquele discípulo a quem Jesus amava", João, o qual disse a Pedro: "É o Senhor" (v. 7). Essa aparição, porém, foi muito importante para Pedro, pois o Senhor chamou-o para uma conversa à parte depois do jantar, alusiva ao pastoreio da Igreja nascente. O que Pedro esperava após ter negado o Senhor triplamente? Mais uma vez, Ele surpreendeu-o. Em lugar de uma repreensão tríplice, O Senhor dirigiu-lhe três perguntas amorosas para, em seguida, incumbi-lo de uma importante missão, também repetida por três vezes (Jo 21.15-17). Pedro descera a escada da negação e quase chegara ao fundo do poço, mas Jesus amorosamente o levou a subir os três degraus da escada do amor. Quando Jesus chamou Pedro para fazer parte do treinamento dos Doze, também no mar da Galileia, deu-lhe autoridade e entregou-lhe todas as ferramentas necessárias para "pescar homens". Agora, esse apóstolo passaria a acumular mais uma função no Reino de Deus. Além de "pescar almas", deveria cuidar delas como se fossem ovelhas. 

Como uma preparação para o assunto do próximo capítulo, o autor trabalha o termo “pentecostal” e afirma que em Atos dos Apóstolos, são mencionados vários Pentecostes ou derramamentos de poder do Espírito similares ao de Atos 2.1-13. Pedro, inclusive, participou de, pelo menos, quatro desses eventos que tiveram o Paráclito como protagonista. O dom de línguas não é mencionado apenas no segundo capítulo de Atos dos Apóstolos; ele é mencionado em outros parágrafos (At 10.44-46; 19.6). A partir daí, o autor denomina que todas as manifestações tratam-se de um “pentecoste”, são eles: Dois Pentecostes em Jerusalém (At 2.1-4; 4.24-31); Pentecostes em Samaria (At 8.14-19); Pentecostes em Cesareia (At 10.1-33); Pentecostes em Antioquia, Chipre e cidades da Ásia menor (At 13.1-52); Pentecostes em macedônia e Acaia (1 Ts 5.19-21; 1 Co 12.1,28) e Pentecostes em Éfeso (At 18.24-48). 

E conclui: É emblemática a imagem de Pedro antes da morte de Jesus, estando ele "[...] assentado entre os serventuários, aquentando-se ao fogo (Mc 14.54, ARA). Após a crucificação e ressurreição do Salvador, porém, vemo-lo "levantando-se" (Lc 24.12), como que tentando recomeçar. E, logo depois da ascensão do Senhor, ele novamente se levantou "no melo dos discípulos" (At 1.15). Trata-se de um levantar-se diferente; de um líder querendo realizar a Grande Comissão deixada pelo Mestre (Mt 28.16-20). Entretanto, somente após a descida do Paráclito, esse novo homem põe-se em pé cheio do Espírito Santo (At 2.14). A partir do dia de Pentecostes, seu levantar passou a ser diferente. Jesus cumprira a promessa de derramar o poder dinâmico do Espírito sobre todos os que cressem, e, assim, inaugurou-se uma nova época para os apóstolos e todos os discípulos do Senhor. [p.127-153 


CAPÍTULO 6 – PRIMEIRO PREGADOR PENTECOSTAL 

Para o autor, Pedro, foi o primeiro pregador pentecostal e este capítulo trata-se de uma análise do conteúdo de TRÊS pregações deste apóstolo. Estas pregações, são denominadas de pregações pentecostais. Portanto, temos a “primeira pregação pentecostal” e a “segunda pregação pentecostal”. Em determinado momento deste capítulo, o autor fundamenta na primeira pregação “pentecostal” de Pedro, a origem do movimento pentecostal. Ele escreve: Seu primeiro sermão reflete suas convicções claras". 

A PRIMEIRA mensagem ministrada por um pregador pentecostal - Para o autor é uma mensagem cristocêntrica, pois o pregador pentecostal inicia sua prédica com "Jesus Nazareno" (At 2.22) e irá terminá-la com "Senhor e Cristo" (v. 36). A mensagem chama atenção dos ouvintes de que a morte de Jesus na cruz estava na agenda de Deus. Nesse caso, mesmo que os israelitas tenham-no rejeitado, crucificando-o, isso não ocorreu de modo acidental, e sim de acordo com o plano do Senhor de salvar dentre os seres humanos todos aqueles que crerem na morte sacrificial, vicária e expiatória do seu Filho Unigênito (Jo 3.16; Rm 10.9,10). Tem uma rica argumentação fundamentada no pacto davídico, pelo qual sempre haveria representante no trono de Davi até a manifestação do Rei messiânico (cf. SI 89.3,4; 132.11,12; 2 Sm 7.11-16). Se a introdução é Cristocêntrica, a sua conclusão não é diferente. Ao concluir sua mensagem cristocêntrica, que também dá ênfase para a obra do Paráclito, Pedro depara-se com um resultado surpreendente. Pedro talvez não imaginasse que a exposição das Escrituras, ungida pelo Espírito Santo, acicataria as consciências dos judeus, estimulando-os a tomar uma posição. (1) Arrependimento: a verdadeira pregação pentecostal é cristocêntrica e enfatiza o arrependimento, seguindo os exemplos de João Batista, Jesus e os apóstolos (Mt 3.1,2; 4.17; At 2.38; 3.19). (2) Perdão dos pecados: Pedro disse que cada um dos arrependidos deveria ser batizado no nome de Jesus Cristo — ou sobre a autoridade que há no seu nome — "para perdão dos pecados". 

Aqui o autor enfatiza a origem do Movimento Pentecostal. Diz que, Segundo o primeiro pregador pentecostal, a ressurreição do Messias foi somente parte de um processo pelo qual o Onipotente elevou-o pela sua destra a uma exaltada posição de autoridade. Deus Pai fez isso depois que seu Filho Unigênito pagou o preço, vencendo a batalha contra o pecado e a morte (cf. Fp 2.6-11; Hb 1.3-8), para que os salvos também se assentem nos céus a destra do trono da Majestade" (Hb 8.1; cf. Cl 3.1,2; Ef 2.6). Pedro liga a ressurreição e a ascensão do Senhor à descida do Paráclito, enfatizando que Jesus derramou o poder do alto sobre os salvos porque foi exaltado pela destra do Pai (At 2.33-35). Ele esclarece o papel de cada uma das Pessoas da Trindade na concessão do batismo com o Espírito Santo: Deus e o Doador; Jesus, o Batizador (Batista); e o Paráclito, o Executivo, já que, ao ser derramado, todos falaram em línguas "conforme o Espirito Santo lhes concedia que falassem" (v. 4). Portanto, o batismo com o Espírito Santo torna-se, para todos os cristãos, a partir do dia de Pentecostes, uma evidência de que Jesus morreu, ressuscitou, ascendeu ao céu e está a destra de Deus Pai intercedendo por nós. 

A SEGUNDA mensagem ministrada por um pregador pentecostal – A segunda mensagem tem um conteúdo muito parecido com primeira. Trata-se de uma exposição da Morte e Ressurreição de Jesus – onde Pedro dirige aos judeus ali presentes acusações muito duras a respeito do Messias, dizendo-lhes que cometeram, numa gradação ascendente, quatro pecados (At 3.13-15). Eles entregaram o Santo e Justo (cf. Is 53-11; Zc 9.9) a Pilatos (Jo 18.38-40), negando-o duplamente (19.6) e considerando-o pior que o homicida Barrabás (Lc 23.18). E, por fim, mataram o Príncipe da vida (Jo 19.12-16), "ao qual Deus ressuscitou dos mortos" (At 3.15). E, sem esperar que lhe perguntem o que fazer, dessa vez adianta-se e brada: "Arrependei-vos, pois, e convertei-vos, para que sejam apagados os vossos pecados, e venham, assim, os tempos do refrigério pela presença do Senhor" (v. 19). O diferencial consiste que nessa segunda pregação pentecostal, o foco continua sendo a obra redentora de Jesus; Pedro, porém, introduz um terceiro elemento. Primeiro, ele afirma que o Autor da vida foi morto pelos judeus e ressuscitou. Em segundo lugar, convida seus ouvintes a converterem--se, o que implica crer e arrepender-se para que recebam a salvação pela graça de Deus. A novidade em relação à primeira pregação pentecostal é o anúncio da Segunda Vinda (At 3.20). Outro detalhe enfatizado pelo autor é que na primeira pregação pentecostal, Pedro deu destaque a Davi como tipo de Cristo e profeta messiânico. Na segunda, menciona não somente o profeta Moisés, mas também Samuel — que ungiu a Davi como rei de Israel (1 Sm 16.13) —, o qual foi o primeiro a profetizar sobre o estabelecimento do Reino davídico ou messiânico (13.14; 15.28; 28.17). E, desde Samuel, todos os profetas predisseram acontecimentos alusivos ao Messias, como argumenta Pedro (At 3.24). 

Examinemos, pois, a TERCEIRA mensagem do evangelho ministrada por um pregador pentecostal - Embora o autor denomine de “Terceira Pregação Pentecostal”, eu vejo mais como uma defesa da fé apostólica perante os inimigos de Cristo. E nessa defesa, os argumentos de Pedro são perfeitos e serve para o nosso “treinamento”. Pedro e João ainda estavam falando — isto é, conversando com os inúmeros novos convertidos e respondendo às suas indagações — quando chegaram alguns sacerdotes, o capitão do Templo e um grupo de saduceus, todos "doendo-se muito de que ensinassem o povo e anunciassem em Jesus a ressurreição dos mortos" (At 4.2). Essa comitiva estava ali para conduzir os apóstolos ao Sinédrio, mas, como já era tarde, prenderam os dois até o dia seguinte (v. 3). Depois de uma terrível noite na prisão, Pedro e João teriam de comparecer ante o concilio supremo que regia as questões religiosas dos judeus (Sinédrio), formado por cerca de 70 membros, quase todos cheios de inveja, que tinham acabado de condenar Jesus de modo injusto (Jo 18.12-24). E, então, perguntaram aos apóstolos: "Com que poder ou em nome de quem fizestes isto?" (At 4.7), o que deu a Pedro a oportunidade de iniciar sua terceira pregação pentecostal. Esta seria uma mensagem rápida, sem muitos pormenores, porém suficiente para enfurecer ainda mais os inimigos do Caminho. A partir daqui o autor mostra que a mensagem de Pedro Sucinta e Objetiva. Convocado para falar em sua defesa e de João, ele faz uma apologia do evangelho, dizendo que fala e age em nome de Jesus, e reitera tanto a acusação aos judeus pela crucificação de Cristo como sua gloriosa ressurreição (At 4.8-10). Com isso, Pedro e os demais apóstolos manifestavam: Vida renovada, autoridade, obediência a Deus, companhia do Paráclito, sofrimento, milagres que ratificavam a pregação, uma agenda nas mãos de Deus e o surgimento de adversários era constante. [p.155-190] 


CAPÍTULO 7 – LINHA DE CHEGADA 

Neste capítulo tem quatro aspectos bíblicos que me serviram de “treinamento”. (1) A ordem dos apóstolos estabelecidas de forma harmônica nos Evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas e Atos dos Apóstolos. (2) para quem gosta de estudar biografia bíblica, neste capítulo um histórico de vida cada um dos apóstolos (3) a quarta pregação pentecostal de Pedro e (4) a linha de chegada do apóstolo Pedro, ou seja, os seus últimos dias de vida. 

Em Mateus, a lista dos apóstolos é apresentada na seguinte ordem: "primeiro, Simão, por sobrenome Pedro, e André, seu irmão; Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão; Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o publicano; Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu; Simão, o Zelote, e Judas Iscariotes, que foi quem o traiu" (10.2-4, ARA). Em Marcos, os quatro primeiros são Pedro, Tiago, João e André; e Mateus (Levi) troca de lugar com Tomé (3.15-19). Em Lucas, mantém-se André como o segundo; e Tadeu (Lebeu) troca de posição com Simão Zelote (6.14-16). O mesmo Lucas, em seu segundo tratado, Atos dos Apóstolos, altera a ordem de sua primeira relação e apresenta Pedro, João e Tiago como os primeiros, elevando João à segunda posição e passando André para a quarta. Tomé troca de lugar com Bartolomeu, passando do oitavo para o sexto. Com isso, Mateus cai para o oitavo lugar. Quanto ajudas, o traidor, está evidentemente fora dessa lista apostólica final (At 1.13, ARA). Essas mudanças de posição não ocorrem de modo aleatório. Estamos, de fato, diante de uma maratona apostólica, cujas colo cações estão relacionadas com os feitos dos Doze e a consideração que a comunidade cristã tinha para com eles. Vamos, então, antes de retomar a linha do tempo de Pedro, conhecer brevemente cada um desses "competidores" ou "maratonistas", começando pelo último colocado. 

Na QUARTA pregação pentecostal, o autor, enfatiza novamente a o conteúdo simples e direta, pois Deus trata todas as pessoas de modo igual; Ele não as julga com base em aspectos como nacionalidade, sexo ou condição social (Ef 2.11-13). A conversa prévia com o centurião Cornélio, em Cesareia, parece ter ajudado o apóstolo Pedro a entender, de uma vez por todas, o significado da visão que tivera em Jope (At 10.24-33). O pregador pentecostal parece ter percebido que seu auditório está sedento, disposto a receber Jesus como Salvador e Senhor. E, por isso, adota uma linguagem adequada ao seu público, diferente da empregada diante dos judeus em Jerusalém. Todo pregador deve conhecer o seu auditório, de modo gerai, para que suas palavras sejam inteligíveis. Além de simples e direta, a mensagem é cristocêntrica. Pedro dá destaque para o ministério itinerante de Jesus de Nazaré. 

Após ser batizado por João Batista e ungido por Deus com o Espírito Santo e com poder. O Senhor cumpriu seu tríplice ministério até que o “mataram, pendurando-o num madeiro. A este ressuscitou Deus ao terceiro dia e fez que se manifestasse, não a todo o povo, mas às testemunhas que Deus antes ordenara; a nós que comemos e bebemos juntamente com ele, depois que ressuscitou dos mortos. E nos mandou pregar ao povo e testificar que ele é o que por Deus foi constituído juiz dos vivos e dos mortos” (At 10.39-42). Em poucas palavras, Pedro deixa Cornélio e sua casa a par do que significa o evangelho. Cristo morreu na cruz e ressuscitou ao terceiro dia segundo as Escrituras (1 Co 15.3,4), mandou-nos cumprir a Grande Comissão (At 1.7,8) e, em breve, "há de julgar os vivos e os mortos, na sua vinda e no seu reino" (2Tm 4.1). O pregador pentecostal conclui enfatizando a necessidade de arrepender-se dos pecados: "A este dão testemunho todos os profetas, de que todos os que nele creem receberão o perdão dos pecados pelo seu nome" (v. 43). 

Com respeito, a linha de chegada, aprendemos que o primeiro pregador pentecostal finalmente cruza a linha de chegada na maratona apostólica, acabando a carreira e guardando a fé. Ele, que correu muito bem, termina sua jornada como um apóstolo maduro, presbítero entre presbíteros, "testemunha das aflições de Cristo" (1 Pe 5.1) e firmado na "verdadeira graça de Deus" (v. 12). Não por acaso, suas últimas palavras registradas nas Escrituras são estas: "crescei na graça e conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. A ele seja dada a glória, assim agora como no dia eternidade. Amém!" (2 Pe 3.18). Antes de sair de cena, ele afirmou em Atos dos Apóstolos: "cremos que fomos salvos pela graça do Senhor Jesus" (15.11, ARA). E agora, momentos antes de deixar seu "tabernáculo" (2 Pe 1.14), já a caminho do "tabernáculo de Deus" (Ap 21.3), assevera: "crescei na graça". A vida desse primeiro pregador pentecostal ensina-nos que somos dependentes da graça do Senhor. Aliás, a Bíblia, o Livro de Deus, começa com uma ação do Deus de toda a graça (Gn 1.1; 1 Pe 5.10) e termina assim: "A graça de nosso Senhor Jesus Cristo seja com todos vós. Amém!" (Ap 22.21). Tudo é pela graça do Senhor, preveniente, salvífica, abundante e fortalecedora] E por ela que fomos salvos, somos salvos e seremos salvos! [p.191-228] 

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Este livro faz parte da coleção "PREGADORES DA BÍBLIA". Para ler a resenha é só clicar nos títulos dos livros:
João Batista - O pregador politicamente incorreto

Estevão – O primeiro apologista do evangelho

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