O livro é constituído por sete ensaios espirituosos e lúcidos, onde o grande escritor, pensador, teólogo popular e apologista cristão C.S. Escritos entre os anos 1952 e 1959, Lewis aborda diversas questões religiosas intrigantes e complexas. Os ensaios desse belo livro editado pela Thomas Nelson Brasil mostram a versatilidade de temas que Lewis pode discorrer. A série começa falando sobre oração, segue comentando a crença, trata sobre intelectuais, retoma o personagem Maldanado das Cartas, discorre sobre o sentido atual do trabalho, comenta a possibilidade de vida e fé fora do planeta e, por fim, medita sobre a Última Noite. A proposta do livro “A última noite do mundo” é dar ao leitor uma possibilidade de ver trechos de seu trabalho intelectual, apologético e literário. Uma experiência que passa por boa parte daquilo que a produção de Lewis nos legou. [1]
“A eficácia da oração” publicado em 1959 depois de citar testemunhos de orações respondidas, ele traz uma questão interessante: as respostas de oração acontecem porque se ora, ou pensar dessa forma se resume numa infantilidade ou imaturidade religiosa? É porque uma oração se parece atendida que ela é real e eficaz? Ele magnificamente responde: “Mas, mesmo se todas as coisas pelas quais as pessoas oram acontecer, o que não ocorre, isso não provaria o que os cristãos chamam de eficácia da oração”. Define sintomaticamente essa ideia assumindo a máxima: “Oração é um pedido”.
“Sobre a obstinação na crença” (1955) versa sobre a fé cristã e o crer científico e a diferença entre ambos. E porque tem que ser assim. Esse documento foi escrito para o Clube Socrático de Oxford e é um argumento apologético brilhante. O autor vai falar sobre a razão de acreditarmos em Deus. Assim como um médico vê um homem e diz acreditar que ele tenha sido envenenado, até examiná-lo e tirar o "acredito" da jogada, assim nós acreditamos na existência de Deus pois temos fatos pessoais que nos provam a existência dEle, Eu acredito que o computador que escrevo existe porque estou vendo ele, acredito que minha irmã existe porque conheço ela, mas não apenas acredito, eu sei que existem, e esse saber vem de experiências pessoais e conhecimento adquirido. Então nossa obstinação na crença da existência de Deus, não é porque levamos em consideração a possibilidade, mas porque temos uma certeza a respeito disso.[2]
“Lírios que apodrecem” (1955) trata da intelectualidade, principalmente da ideia de que intelectuais são mais refinados que outros homens (Lewis prova que não é assim). A “carientocracia”, ou o domínio dos sábios, é um perigo para a humanidade. Os governos políticos tampouco devem ser carientocratas, porque “a cultura é uma qualificação ruim para uma classe governante, pois não qualifica os homens para governar[...]” O artigo segue mostrando os perigos para a futura geração, pois a escola, desde as séries básicas, está contaminada com a ideia de “cultura progressista”, produzindo apenas hipócritas. Um artigo bastante denso e extenso, um dos que mais gostei. [3]
“Maldanado propõe um brinde” (1959) para mim, embora muito conhecido, mas, o que Lewis faz em “Maldanado propõe um brinde” não é um exercício de futurologia, apesar de utilizarmos a hipérbole que leva a conclusão de algo sobrenatural, mas sim a apurada percepção da transformação da educação na Inglaterra. Uma educação formatada para os fracos, que logo cruzou o atlântico e causou a desgraça completa da nossa civilização. Em seu discurso para os demônios estreantes, Maldanado ainda prescreve uma via de acesso rápido para a concretização dessa “Educação democrática”, quando diz: “É claro que isso só aconteceria se toda a educação se tornasse estatal” (LEWIS, P.83, 2018). Não nos surpreende constatar que essa é justamente a nossa realidade. Uma educação completamente aparelhada pelo Estado, que quando não faz às vezes fornecedor, atua como concessor. E aqui nem vamos aprofundar as discussões sobre as dificuldades maquinadas pelo “Estado babá” para impedir a educação privada, a exemplo dos empecilhos criados pelo STF ao Homeschooling.[4]
“Boa obra e boas obras” (1959). Em “Boa obra e boas obras” temos o abandono que há nas atividades realizadas. Seja pela dificuldade de ver um sentido real para o trabalho, seja pela péssima qualidade do que é feito. Tudo tem data de validade programada para pouquíssimos anos, é a nossa obsolescência programada: nenhuma obra, hoje, é boa o suficiente para a vida.
“Religião e foguetes” (1958) O interesse da implicação cósmica da ideia de redenção cristã permeia esse texto. Escrevendo em 1958, portanto 20 anos após o início da publicação do primeiro livro da trilogia, Lewis procurou responder brevemente acerca da “absurda arrogância, crer que fomos privilegiados com exclusividade” nesse vasto universo. Lewis especula sobre os seguintes temas: (1) existem animais em outro lugar além da Terra? (2) Se existirem, algum desses animais teria o que chamamos de “alma racional”? (3) se existirem espécies, e espécies racionais, além do homem, algumas ou todas elas, como nós caíram? (4) Se todas elas ou algumas delas tenha caído, foi-lhes negada a Redenção pela Encarnação e Paixão de Cristo? (5) se soubéssemos (mas não sabemos) as respostas a 1, 2 e 3 – e além disso, se soubéssemos que a Redenção por uma Encarnação e uma Paixão foi negada a criaturas necessitadas -, é certo que esse é o único modo de Redenção que é possível? O questionamento final é “se existe vida inteligente - além dos humanos - no universo, então o cristianismo é absurdo e paroquial na sua ideia de que o homem é importante para Deus”. Artigo extremamente perspicaz e indispensável a todo cristão.
“A Última Noite do Mundo” (1952) versa sobre a relutância que existe hoje em falar sobre a segunda vinda de Cristo. A questão principal não é a vergonha que os cristãos sentem com os falsos pregadores que já anunciaram o fim do mundo diversas vezes, e sim que a nossa pregação tem sido contaminada pelo pensamento moderno de que a humanidade está evoluindo. Lewis rebate esses pensamentos e levanta outras questões apologéticas importantes sobre a inerrância das Escrituras. [5]
CONCLUSÃO Ora, todos os ensaios nos levam a ótimas reflexões sobre nossa relação com nós mesmos, com o próximo e com Deus. A exigência de uma resposta para a oração; ou a loucura do trabalho impensado e alienado; a condição humana frente a criação e a possibilidade de ação missionária fora do planeta.
A vida do homem não se pauta mais no temor da última noite. Enquanto cada vez mais a posição científica de ver o mundo mácula até mesmo a fé, muitos caem no fanatismo das seitas apocalípticas e vivem de marcações e remarcações do fim dos dias. Viver em meio ao mundo sabendo que prestará contas de tudo é aquilo que nos direciona ao eterno. É o que nos faz atuar em nosso teatro sem medo da aproximação do autor da peça.
A melhor lição que podemos tirar desses ensaios é: viver procurando fazer bem qualquer coisa, desde a oração ao trabalho científico. Porque será assim que não haverá medo da última noite do mundo.[6]
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LEWIS, C. S. A última noite do mundo. Rio de janeiro, RJ: Thomas Nelson Brasil, 2018. 144p.
Créditos
[1] Tobias Goulão. https://medium.com/@tobiasgoulao/%C3%BAltima-noite-do-mundo-73ec3fbe47eb
[2] Rudimar Baroncello. https://hiattos.blogspot.com/2019/08/opiniao-ultima-noite-do-mundo-c-s-lewis.html
[3] Silvia Schigueo. https://www.facebook.com/C.S.LewisFrases/posts/1080332388804669/
[4] Reação Adventista. https://reacaoadventista.com/2018/10/01/c-s-lewis-previu-a-diabolica-pedagogia-do-oprimido/
[5] Silvia Schigueo. https://www.facebook.com/C.S.LewisFrases/posts/1080332388804669/
[6] Tobias Goulão. https://medium.com/@tobiasgoulao/%C3%BAltima-noite-do-mundo-73ec3fbe47eb
Um comentário:
Estou lendo este livro no momento, e apesar da linguagem um tanto robuscada, devido ao contexto em que foi escrito, apresenta-se muito atual, tornando-se interessante e envolvente.
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