terça-feira, 7 de agosto de 2018

A VERDADE DO EVANGELHO [Resenha]


STOTT, John. A Verdade do Evangelho: Um apelo à Unidade – Um apelo à unidade. Curitiba, PR: Editora Esperança, 2016. 172p.


Para quem conhece John Stott, sabe de sua luta pela unidade da igreja visível, que de acordo com as suas palavras a ausência dessa unidade é uma tragédia. “Minha preocupação é chamar a atenção para uma das grandes tragédias da cristandade contemporânea, que é especialmente visível no meio de todos nós que somos chamados (e, na verdade, é como nós nos chamamos) cristãos evangélicos. Numa única palavra: essa tragédia chama-se polarização. Serei mais específico sobre o que quero dizer.” [1]

Stott entende que hoje, muitos dos nossos cristãos evangélicos não hesitam em ceder a tendência patológica que temos de fragmentar-nos. Para tanto, refugiamo-nos em nossas convicções sobre a unidade invisível da igreja , como se a sua manifestação visível não importasse. E o resultado disso é que o diabo acaba tendo o maior sucesso na sua velha estratégia de “dividir e conquistar”. A nossa desunião continua sendo um grande empecilho para o nosso evangelismo.

“Mesmo mantendo uma boa consciência de qual seja a nossa interpretação pessoal da fé evangélica, será que não seria possível reconhecermos que o que nos une enquanto povo evangélico é muito maior do que aquilo que nos divide?” [p.10]

Portanto, este livro foi escrito com dois propósitos: (1) Primeiro, porque o entristece profundamente essa tendência que nós, evangélicos, temos para a fragmentação. (2) “Além disso, tenho uma motivação bem mais pessoal: ao chegar ao fim de minha vida aqui na terra, e como este ano completo sessenta anos de discipulado cristão privilegiado, eu gostaria de deixar para trás, como uma espécie de legado espiritual, este pequeno testemunho de fé evangélica, este apelo pessoal às gerações que estão surgindo. É óbvio que eu mudei muito ao longo das últimas seis décadas. Mas espero que essas mudanças não tenham sido para negar qualquer coisa que eu já tenha afirmado, mas sim para o enriquecimento do que foi inadequado, o aprofundamento do que era superficial e para esclarecer o que era obscuro. As grandes verdades do evangelho permanecem inalteradas. É assim que eu gostaria de ser lembrado e julgado enquanto me preparo para apresentar-me para ser julgado diante do trono de Cristo” [p.11]. 

O livro está dividido em 6 partes – Introdução, capítulos 1 ao 3, conclusão e um posfácio que expõe de forma simples e ao mesmo tempo, profundamente teológica, aspectos importantes sobre os quais, segundo Stott, são pontos essenciais e indivisíveis da fé cristã. A introdução ele expõe as verdades essenciais do Evangelho e faz uma apologética do Evangelho Trinitário. Em seguida vêm os capítulos que tratam de pontos inegociáveis fé cristã. São eles: a revelação de Deus [cap.1], a Cruz de Cristo [cap.2], o ministério do Espírito Santo. Na conclusão ele enfatiza os desafios que os evangélicos devem enfrentar na pureza deste evangelho: dignidade, firmeza, lutar, trabalhar e sofrer por amor ao Evangelho. No posfácio, ele fala daquele assunto que está presente em todos os seus livros – “A Excelência da Humildade”.


INTRODUÇÃO – Stott afirma que o movimento evangélico tem crescido muito a partir da Segunda Guerra Mundial, mas, paralelamente, tem crescido a “impopularidade” também. Ou seja, o movimento evangélico cresce com muita rapidez e pelo outro lado provoca tanto escárnio. 

Ele cita vários testemunhos negativos acerca dos evangélicos e com o propósito de esclarecer o que é realmente é a fé evangélica, ele escreve três refutações: “Primeiro, a fé evangélica não é uma inovação recente, uma nova marca de cristianismo que resolvemos inventar. Pelo contrário, atrevemo-nos a dizer que o cristianismo evangélico é o cristianismo original, apostólico, o cristianismo do Novo Testamento” [p.17]. Para fundamentar aquilo que os críticos dizem que os evangélicos são “inventores de novas doutrinas”, ele faz citação de Lutero, Hugh Latimer, John Jewel, John Wesley e Billy Graham. 

É preciso ficar claro que a fé evangélica não trouxe nenhuma doutrina nova: “Não é doutrina nossa que trazemos a vós neste dia; nós não a escrevemos, não a descobrimos, não a inventamos; nós vos apresentamos nada mais do que aquilo que nos trouxeram os antigos pais da Igreja, os apóstolos e o próprio Cristo nosso Salvador antes de nós” – John Jewel [p.17].

“Em segundo lugar, a fé evangélica não é um desvio do cristianismo ortodoxo. Não é um cristianismo alternativo nem de vanguarda, é cristianismo conservador” [p.18]. É muito interessante o que Stott escreve. Pois o termo evangélico não é um termo pejorativo. Mas, ser evangélico está ligado a própria historia do cristianismo. No século dezessete ele já era aplicado tanto aos puritanos da Inglaterra quanto aos pietistas alemães, e no século dezesseis aos reformadores. Eles se auto denominavam “evangelici”, de “evangelici viri”, “homens evangélicos”, uma designação que Lutero adotou como “die Evangelischen”. A partir daqui, Stott faz referência a homens que foram considerados evangélicos e que traz dignidade a este termo. John Wycliffe, as vezes descrito como “estrela da manhã da Reforma”, foi chamado de doctor evangelicius. Em seguida ele cita “die Evangelischen”, ou seja, homens evangélicos: Agostinho, Charles Simeon, William Wilberforce,Anthony Ashley Cooper, J. C. Ryle, Charles G. Finney, D. L. Moody e Charles Hodge. 

“Em terceiro lugar, a fé evangélica não é sinônimo de fundamentalismo. As duas coisas têm diferentes histórias e diferentes conotações” [p.20]. Acho muito importante as conceituações que Stott faz aqui.

O “fundamentalismo” (designação que hoje em dia se costuma usar como um termo teológico pejorativo) teve origens de muito respeito. Surgiu de uma série de doze livretos intitulados Os Fundamentos, que foram distribuídos entre 1909 e 1915. Os “fundamentos” em questão incluíam verdades cristãs básicas, escritos de personalidades evangélicas do porte de R. A. Torrey, B. B. Warfield, A. T. Pierson, James Orr, Campbell Morgan, J. C. Ryle e Handley Moule. A palavra “fundamentalista” foi cunhada para definir qualquer pessoa que acreditava nas afirmações centrais da fé cristã.[2]

Aos poucos, contudo, fundamentalismo foi se associando, na mente das pessoas, a certos extremismos e extravagâncias, e isso faz com que a grande maioria dos cristãos nega o rótulo de “fundamentalistas"; e, se eles o fazem, é porque discordam de muitos fundamentalistas autoproduzidos em muitos pontos de extrema importância. Daqui em diante Stott começa escrever de como foi que surgiu a diferença entre os termos Fundamentalistas e Evangélicos ou Evangelical e apresenta dez tendências a considerar no que diz respeito: ao pensamento humano, natureza, inspiração e interpretação da Bíblia, movimento ecumênico, igreja, mundo, ração, missão cristã e esperança cristã.

A definição que Stott faz de “evangélico” é uma outra coisa bastante interessante: “Quando se tenta definir o que significa ser evangélico, é inevitável que se comece com o evangelho, pois tanto nossa teologia (evangelicalismo) quando nossa ação (evangelismo) derivam seu significado e sua importância das boas novas (o evangelho). E sempre que pensamos no evangelho, há sempre três perguntas e três respostas fundamentais que vêm à nossa mente e que têm a ver com a origem, a substância e a eficácia do evangelho” [p.33].

Portanto, pelo que se entende sobre o que é o evangelho, resume-se assim: A origem do evangelho não foi especulação, mas revelação; sua substância não é a sabedoria do mundo, mas a cruz de Cristo; e sua eficácia não se deve à retórica, mas ao poder do Espírito Santo. Assim, o evangelho provém de Deus, está centrado em Cristo e sua cruz e é confirmado pelo Espírito Santo. 


CAPÍTULO 1 – A REVELAÇÃO DE DEUS: O propósito deste capítulo é explorar um aspecto importante da identidade evangélica – a autoridade das Escrituras -. Por que os evangélicos atribuem autoridade às Escrituras? E quais são as consequências de acreditarmos nisso? Para responder a esta pergunta, o autor, três perspectivas evangélica acerca das Escrituras - “revelação", “inspiração" e “autoridade".

a) Revelação - “Quando se trata de conhecer a Deus, toda a iniciativa depende d’Ele. Se Ele não se quiser revelar, nada do que façamos nos permitirá encontra-lo.” Esta citação de C. S. Lewis em sua obra “As Crônicas de Nárnia” pode causar um certo “desconforto”. Por que? Stott, responde: “No princípio do pensamento evangélico está o reconhecimento da razoabilidade lógica e óbvia da revelação. Como Deus é nosso Criador, infinito no seu ser, e nós criaturas finitas dentro do tempo e do espaço, é lógico que não podemos descobri-lo por nossas próprias pesquisas ou recursos. Ele está inteiramente além de nós. E mais: como ele é o Deus Santo, enquanto nós somos caídos, pecadores e sujeitos ao seu justo juízo, existe entre ele e nós um abismo que nós, de onde estamos, nunca poderíamos ultrapassar. Finitos e caídos como somos, não podemos A revelação de Deus alcançá-lo. Jamais poderíamos conhecê-lo (a não ser que ele tomasse a iniciativa de se fazer conhecido), e todos os altares do mundo, como aquele em que Paulo tropeçou nos arredores de Atenas, teriam de levar a inscrição AO DEUS DESCONHECIDO (At 17.23). Ele permaneceria incompreensível e inacessível a nós” [p.45-46].

- Revelação Geral ou natural – Esta é a revelação dada à partir da criação. A existência de Deus vem no observar das suas obras, da natureza, do universo, por várias manifestações que podem chegar ao conhecimento das pessoas. Por natureza o homem tem o que é chamado de “Testemunho interno” onde o espírito do homem testifica pela existência de um ser divino e isso pode ser comprovado dando o exemplo: por todas as culturas em tempos e lugares diferentes, que sempre buscaram algo superior a elas para acreditarem e colocarem a sua crença. A revelação natural é, portanto, suficiente para condenar, mas não para salvar. Devido ao estado decaído do homem, a revelação natural não é nem clara nem suficiente para que as verdades necessárias à sua salvação sejam compreendidas.

- Revelação Especial ou sobrenatural – Stott escreveu: “A revelação especial se deu através de milagre (inspiração e encarnação). Essa combinação entre inspiração e encarnação é vital. Nós, evangélicos, muitas vezes cometemos o erro de isolar a Bíblia e dar-lhe um lugar de honra. Mas o clímax da revelação de Deus foi seu Filho encarnado, o Verbo feito carne: ‘Mas nestes últimos dias nos falou por meio do Filho...’ (Hb 1.2a)” [p.49].

A revelação geral não revela Jesus Cristo ou Sua obra redentora dirigida aos pecadores. Assim, torna-se necessário aquilo que é chamado de “revelação especial”. A revelação especial é a revelação do caminho da salvação. Um dos textos bíblicos mais importantes descrevendo a revelação especial de Deus encontra-se em Hebreus 1:1-2, que diz: “Há muito tempo Deus falou muitas vezes e de várias maneiras aos nossos antepassados por meio dos profetas, mas nestes últimos dias falou-nos por meio do Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas e por meio de quem fez o universo.” Em tempos passados, antes da conclusão das Escrituras, Deus revelou Sua obra redentora por meio dos profetas, através de sonhos, visões e teofanias. Mas, agora, a revelação especial recebeu sua forma permanente nas Escrituras do Antigo e Novo Testamento.

Para concluir esta parte, Stott estabelece escreve que além da revelação de Deus ter sido gradativa, há um outro aspecto importante que é a iluminação, ou seja, a revelação pessoal. 

“’Revelação’ neste contexto descreve um evento objetivo: o Espírito Santo expõe a glória de Deus na natureza ou através da Escritura. ‘Iluminação’, por sua vez, descreve um evento subjetivo: o Espírito Santo ilumina nossos olhos para que agora possamos ver o que ele revelou” [p. 55-56].

Iluminação, esta palavra significa "fazer a luz brilhar". Não somos inspirados simplesmente porque não recebemos a revelação, mas somos iluminados para conhecê-la: "sendo iluminados os olhos do vosso coração, para que saibais qual seja a esperança da vossa vocação, e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos" (Ef 1.18). A iluminação é para que os crentes descubram as grandes verdades reveladas por Deus na Sua Palavra e a aplicação para as suas vidas. É através da iluminação que o Espírito Santo concede aos cristãos a capacidade intelectual de compreenderem o que foi inspirado e revelado nas Escrituras. É impossível entendermos a situação de pecado sem intervenção do Espírito Santo, que produz luz em nossa consciência. A Iluminação acontece porque o homem natural não pode discerni-la (1 Co 2.14); a obra de Cristo na cruz faz sentido (1 Co 1.18); e o Espírito Santo ensina (Jo 14.26).

b) Inspiração – “Se a palavra “revelação" indica que Deus tomou a iniciativa de se fazer conhecido, a palavra “inspiração" indica como ele o fez, pelo menos tratando-se da revelação especial: foi falando com os autores humanos e por meio deles. Neste sentido a Bíblia é um livro único; nenhum outro livro se assemelha a ela” [p.60].

"Inspiração" significa que Deus soprou para dentro do autor bíblico a Sua verdade. O conteúdo das Escrituras não é uma especulação ou uma descoberta humana após uma longa e cansativa pesquisa filosófica. Mas seja qual for o método que o autor usou, ou o que Deus usou com o autor, isto é inspiração. Foi Deus quem colocou na mente e no coração do escritor bíblico a capacidade de apreender e de registrar Sua Palavra. Assim dizemos que a Bíblia nasceu no coração e na mente de Deus. E Ele soprou Suas idéias para o homem. Isto é inspiração.

c) Autoridade“Se a palavra ‘revelação’ enfatiza a iniciativa de Deus, dando-se a conhecer, e ‘inspiração’ denota o processo que ele usou, então ‘autoridade’ indica o resultado. Já que as Escrituras são revelação de Deus através do Espírito, elas têm autoridade sobre nós” [p.71].

Os Reformadores recuperaram a doutrina da autoridade das Escrituras canônicas que havia sido soterrada durante a Idade Média. Eles rejeitaram a autoridade e infalibilidade papal e re-estabeleceram a autoridade e infalibilidade das Escrituras. Entenderam que este conceito é derivado da própria escritura e tem raízes nos profetas do Antigo Testamento, no Senhor Jesus e seus apóstolos. Assim, a Escritura passou a ser o Juiz Supremo nas Igrejas protestantes e na vida individual, pelo qual todas as controvérsias religiosas têm de ser determinadas, todos os decretos de concílios, todas as opiniões dos antigos escritores e as doutrinas de homens e opiniões particulares têm de ser examinadas.


CAPÍTULO 2 – A CRUZ DE CRISTO: Neste capítulo Stott apresenta a importância da cruz e todos os seus gloriosos benefícios que Cristo conquistou por meio dela e faz um convite aos leitores: “Se o primeiro fundamento da fé cristã evangélica é a revelação de Deus na Bíblia, o segundo é a cruz de Cristo, junto com todos os gloriosos benefícios que ele conquistou por meio dela. Eu os convido a refletirem comigo neste capítulo sobre uma das mais surpreendentes declarações que o apóstolo Paulo já fez – o que é uma afirmação um tanto ousada da minha parte, uma vez que ele é o autor de um bom número de declarações surpreendentes. Mas eu me refiro aqui à que se encontra em Gálatas 6.14 – Mas longe de mim gloriar-me, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim, e eu, para o mundo” [p.89].

Não há doutrina no cristianismo tão importante quanto a doutrina do Cristo crucificado. Não há nenhuma que o diabo tente tão avidamente destruir. Não há nenhuma tão necessária à nossa própria paz para entendermos. Por “Cristo Crucificado”, refiro-me à doutrina de que Cristo sofreu a morte na cruz para reparar-nos de nossos pecados; que por Sua morte, Ele cumpriu a mais plena, perfeita e completa satisfação de Deus para com os descrentes; e, através dos méritos dessa morte, todos os que acreditaram n’Ele foram perdoados de todos os seus pecados, mesmo sendo estes muitos e grandes, foram inteiramente perdoados e para sempre.

Stott cita os quatro benefícios: Primeiro, na cruz, somos aceitos por Deus; Segundo, na cruz, somos justificados pela fé; Terceiro, na cruz, somos moldados e perdoados; Quarto, na cruz, temos uma mensagem para o mundo.

Sobre o segundo benefício da cruz – Justificados pela fé -, o que temos a comentar é que em nossos dias, a verdade bíblica da justificação pela fé é desconhecida ou mal compreendida por muitos evangélicos. No entanto, ela foi a questão central levantada pela Reforma Protestante do século 16. Assim como o “sola Scriptura” foi denominado o “princípio formal” da Reforma, porque a Bíblia é a fonte de onde procedem todas as autênticas doutrinas cristãs, a justificação mediante a fé é o seu “princípio material”, porque envolve a própria substância ou essência do que se deve crer para a salvação. João Calvino, o pai espiritual das igrejas reformadas, referiu-se a essa doutrina como “o principal ponto de apoio sobre o qual se articula a religião” (Institutas 3.11.1). Ele tratou desse conceito em uma das seções mais longas da sua obra principal (Livro III, Caps. XI-XIX), onde lhe deu a seguinte definição: “Interpretamos a justificação simplesmente como a aceitação pela qual Deus nos recebe em seu favor como homens justos, e dizemos que ela consiste na remissão dos pecados e na imputação da justiça de Cristo” (3.11.1).

Stott, conclui este capítulo afirmando que: “Mas, no final das contas, só nos resta uma alternativa: ou nos gloriamos em nós mesmos e em nossas próprias conquistas, ou nos gloriamos em Cristo e naquilo que ele alcançou na cruz. Não há possibilidade de concessão. Uma marca inequívoca do cristianismo evangélico genuíno é o fato de nós só nos gloriarmos na cruz de Cristo” [p.113].


CAPÍTULO 3 – O MINISTÉRIO DO ESPIRITO SANTO – Neste capítulo fala do terceiro aspecto mais marcante do Evangelho que é o ministério do Espírito Santo. Para Stott, a Bíblia, a cruz e o Espírito Santo tornam-se a tríade fundamental em que se baseiam as verdades do Evangelho. Ou, dito de outra forma, a fé evangélica procura honrar as três pessoas da Trindade estabelecendo como seu foco central a revelação de Deus, a cruz de Cristo e o ministério do Espírito Santo. É Ele – o Espírito Santo – quem nos capacita a viver cada vez mais a plenitude daquilo que Deus disse e realizou na pessoa de Jesus Cristo.

Stott explica que a melhor forma de se compreender quão indispensável é a obra do Espírito Santo seja considerando um por um os seis estágios ou aspectos do discipulado cristão, a começar pelo novo nascimento e encerrando com a esperança cristã, e demonstrar como cada um deles seria impossível sem a atuação do Espírito Santo.

a) O Novo Nascimento – O novo nascimento é uma obra monergística do Espírito Santo. Nascer de novo é nascer de cima, do alto, do Espírito. Stott ensina que o novo nascimento é obra de Deus, é imediato, não é uma experiência consciente e não é a mesma coisa que batismo. 

Conclui: “O novo nascimento é uma mudança interior, profunda e radical efetuada pelo Espírito Santo no recôndito mais íntimo da personalidade humana” [p.122].

b) Segurança Cristã – Todo cristão evangélico não só concorda, mas afirma que a presença do Espírito Santo em nós é a marca por excelência que identifica o povo de Deus hoje; assim, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele (Rm 8.9). Portanto, a habitação do Espírito Santo em nós é o selo pelo qual Deus indica que pertencemos a ele. Um dos principais ministérios do Espírito que habita em nós é proporcionar ao povo de Deus a certeza de salvação por seu relacionamento com ele. 

Stott conclui: “A segurança do cristão está alicerçada, acima de tudo, na cruz. Nós só podemos saber que fomos perdoados porque Cristo assumiu os nossos pecados, carregando-os em nosso lugar, e porque ele o fez de forma completa e consumada. Pois Cristo fez na cruz ao oferecer-se a si mesmo uma única vez (...) um sacrifício pleno, perfeito e suficiente, oblação e satisfação, pelos pecadores do mundo inteiro” [p.128].

c) Santidade Cristã – Um dos grandes propósitos do Espírito Santo é santificar o povo de Deus. A promessa de Deus no Antigo Testamento, porei dentro em vós o meu Espírito, continua: e farei que andeis nos meus estatutos, guardeis os meus juízos e os observeis (Ez 36.27). De fato, as duas promessas mais diretas de Deus no Antigo testamento são estas. A história do evangelicalismo tem sido uma história de busca por santificação. Esta é uma marca que se encontra em todos os séculos: nos reformados, nos puritanos, nos petistas, nos metodistas e em diversos movimentos evangélicos mais recentes. Em nenhum destes predomina algum tipo específico de ensino com relação á santidade. 

Stott conclui: “O Novo Testamento não promete em lugar algum, nem a erradicação do mal, nem a possibilidade de uma perfeição sem pecado – pelo menos nesta vida. Pelo contrário, nós estamos em uma jornada; somos peregrinos que se destinam à cidade celestial. Assim como Paulo, ainda não ‘chegamos lá’ nem ‘fomos aperfeiçoados’, mas prosseguimos para conquistar aquilo para o que também fui conquistado por cristo Jesus (Fp 3.12)” [p.134].

d) Comunidade Cristã - A Bíblia chama a igreja de a família de Deus (Ef 2.19). Família “tanto no céu como sobre a terra” (Ef 3.14-15). É o lar de todos os que pertencem a Deus. A Bíblia fala da igreja como a noiva de Cristo. O Senhor enxerga nela uma beleza cada vez mais radiante; partilha com ela de amor e intimidade profundos. A igreja é mais preciosa para Cristo do que a esposa para seu esposo. A Bíblia também denomina a igreja de o corpo de Cristo. A igreja, como corpo de Cristo, está viva com o Espírito de Cristo e realiza no mundo a obra de Jesus. 

Concluindo este aspecto, Stott diz: “A igreja se encontra no centro do eterno propósito histórico de Deus; e que a igreja faz parte do Evangelho. Além do mais, a igreja está em continuidade direta com o Israel do Antigo Testamento. Portanto, a rigor, não é certo referir-se ao Pentecostes como ‘o dia do nascimento da igreja’, pois a igreja como povo da aliança de deus passou a existir uns dois mil antes disso, com Abraão. O que aconteceu no dia de Pentecostes foi que o povo de Deus tornou-se o corpo de Cristo cheio do Espírito santo. Ela é chamada também de a comunhão do Espírito (2Co 13.13; cf Fp 2.1) porque é a nossa comunhão (koinonia), o fato de fazermos parte desse corpo, que nos faz ser igreja” [p.136].

e) A Missão Cristã – A missão sempre foi uma preocupação dos evangélicos, principalmente a missão mundial da igreja. Evangelicalismo e evangelismo, como as próprias palavras indicam, estão inevitavelmente interligados. E, como evangélicos que somos, uma das coisas que enfatizamos no evangelismo é que o evangelista principal é o Espírito Santo. Ele é um Espírito missionário e o Pentecostes foi um evento missionário. 

Stott afirma: “Esse elo entre o Espírito Santo e a missão cristã é indissolúvel. Negligenciar a missão é contradizer o próprio ser do Espírito Santo. Consequentemente, uma igreja cheia do Espírito tem duas marcas essenciais: seu alcance compassivo na comunidade local e a seriedade do seu compromisso com a missão global” [p.142].


CONCLUSÃO – Essa conclusão tem um título. O DESAFIO DA FÉ EVANGÉLICA. Nos capítulos anteriores foram ressaltados a forma trinitária da fé evangélica. Os capítulos de 1 ao 3, enfatizaram cada aspecto do nosso discipulado: A Palavra, a Cruz e o Espírito santo como as três ênfases evangélicas essenciais. Além de todo esta apresentação, Stott afirma que ser cristão evangélico não é só seguir uma fórmula, por mais ortodoxa que esta seja em sua trinitarismo. Muito mais do que uma crença, a fé evangélica abrange o nosso comportamento; ela traz em seu bojo um desafio que, em suas mais variadas facetas, exige que vivamos em conformidade com a nossa fé. 

O maior desafio da fé evangélica é viver de maneira a honrar a fé evangélica. Ele usa como texto o que o apóstolo Paulo escreveu em Filipenses 1.27-30. A partir deste texto, ele extrai quatro preocupações que Paulo tinha com os crentes de Filipos e os convoca à fidelidade em cinco áreas da vida: O chamado à integridade evangélica, ou a viver uma vida digna do Evangelho; O chamado à estabilidade evangélica, ou a permanecer firme no Evangelho; O chamado à verdade do Evangelho, ou a lutar pela fé evangélica; O chamado à unidade evangélica ou a trabalhar juntos pelo Evangelho e o chamado a perseverança evangélica, ou a sofrer pelo Evangelho.

Stott, conclui afirmando: “Não há como não sermos tocado pelas recomendações que nos traz, através dos séculos, a Carta de Paulo aos cristãos de Filipos. O apóstolo nos chama a vivermos uma vida digna do Evangelho, a permanecermos firmes nele, a lutarmos por ele com afinco, a combatermos por ele em unidade e a nos dispormos a sofrer por ele. Tudo isso faz parte do desafio de manter a fé evangélica nos dias de hoje” [p.165].


Finalmente, na última parte deste magnífico livro, temos o POSFÁCIO [3] que John Stott intitula de A EXCELÊNCIA DA HUMILDADE. Na explicação final deste livro, mais uma vez nos chama atenção que o cristianismo evangélico é um cristianismo trinitário – revelação, redenção e regeneração – associando a revelação com o Pai, a redenção com o Filho e a regeneração com o Espírito Santo. Essas principais doutrinas que os cristãos evangélicos cultivam, se bem compreendidas, tendem a desembocar inevitavelmente na humildade.

Stott, neste final, ele nos diz: “Quanto mais as pessoas da Trindade são glorificadas, mais completamente o orgulho humano é excluído. Glorificar a autorrevelação de Deus é confessar a nossa completa ignorância sem ela. Enaltecer a cruz de Cristo é confessar a nossa total perdição sem ela. Engrandecer o papel regenerador do e santificador do Espírito Santo em nós é confessar o nosso eterno egocentrismo sem ele” [p.168].

RECOMENDO.
Livro disponível in:
Editora Esperança
https://goo.gl/GKHKan

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[1] Unidade, Liberdade e Caridade. John Stott, publicado in: http://www.monergismo.com/textos/advertencias/cristianismo_equilibrado.htm
[2] Se você deseja conhecer mais sobre o que é o Fundamentalismo e Fundamentalista, há um texto escrito pelo Rev. Augustus Nicodemus e publicado em três partes pela Revista Teologia Brasileira, veja os links
Parte 1 - http://www.teologiabrasileira.com.br/teologiadet.asp?codigo=29
Parte 2 - http://www.teologiabrasileira.com.br/teologiadet.asp?codigo=30
Parte 3 - http://www.teologiabrasileira.com.br/teologiadet.asp?codigo=31
[3] Texto de teor explicativo que, acrescentado no final de livro (depois de sua finalização), adverte ou explica o que for conveniente.

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