sábado, 5 de maio de 2018

ATRIBUTOS DE DEUS - AUTO-EXISTÊNCIA, SANTIDADE E ÚNICO



A nossa Confissão de fé[1] declara no capítulo II, seções 1 e 2, o seguinte acerca de Deus:

I. Há um só Deus vivo e verdadeiro, o qual é infinito em seu ser e perfeições. Ele é um espírito puríssimo, invisível, sem corpo, membros ou paixões; é imutável, imenso, eterno, incompreensível, - onipotente, onisciente, santíssimo, completamente livre e absoluto, fazendo tudo para a sua própria glória e segundo o conselho da sua própria vontade, que é reta e imutável. É cheio de amor, é gracioso, misericordioso, longânimo, muito bondoso e verdadeiro remunerador dos que o buscam e, contudo, justíssimo e terrível em seus juízos, pois odeia todo o pecado; de modo algum terá por inocente o culpado.[2]

II. Deus tem em si mesmo, e de si mesmo, toda a vida, glória, bondade e bem-aventurança. Ele é todo suficiente em si e para si, pois não precisa das criaturas que trouxe à existência, não deriva delas glória alguma, mas somente manifesta a sua glória nelas, por elas, para elas e sobre elas. Ele é a única origem de todo o ser; dele, por ele e para ele são todas as coisas e sobre elas tem ele soberano domínio para fazer com elas, para elas e sobre elas tudo quanto quiser. Todas as coisas estão patentes e manifestas diante dele; o seu saber é infinito, infalível e independente da criatura, de sorte que para ele nada é contingente ou incerto. Ele é santíssimo em todos os seus conselhos, em todas as suas obras e em todos os seus preceitos. Da parte dos anjos e dos homens e de qualquer outra criatura lhe são devidos todo o culto, todo o serviço e obediência, que ele há por bem requerer deles.[3]

Que há um só Deus, as Escrituras afirmam constantemente essa verdade:

“Ouve, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor”. Dt 6:4

Assim que, quanto ao comer das coisas sacrificadas aos ídolos, sabemos que o ídolo nada é no mundo, e que não há outro Deus, senão um só. - 1 Co 8:4


1. DEUS O AUTO-EXISTENTE
Dentro das fronteiras do universo em que a humanidade habita, existem dois tipos de seres.

a) Existem aqueles seres que são dependentes uns dos outros. Esta categoria abarca tudo, de elefantes a lesmas, de anjos a demônios, de seres humanos a vírus.

b) Contudo, existe um ser do qual todos os outros dependem. Somente ele é auto-existente – o grande Yahweh (“Jehovah” ou Jeová), que disse a Moisés que o Seu nome é “EU SOU O QUE SOU”

“E disse Deus a Moisés: EU SOU O QUE SOU. Disse mais: Assim dirás aos filhos de Israel: EU SOU me enviou a vós”. - Êxodo 3:14

“João, às sete igrejas que estão na Ásia: Graça e paz seja convosco da parte daquele que é, e que era, e que há de vir, e da dos sete espíritos que estão diante do seu trono”. Apocalipse 1:4

Todos os outros seres extraem o seu sustento e existência a partir Dele. Ele é absolutamente único, de tal forma que Ele não depende (não precisa) de nada fora de Si mesmo.

Apenas Ele possui o que os estudantes de teologia chamam de asseidade, o atributo da auto-existência (João 1:4; 5:26).

“Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens”. João 1:4

Porque, como o Pai tem a vida em si mesmo, assim deu também ao Filho ter a vida em si mesmo”. João 5:26

Como Ele concede a vida para toda a criação, desde o maior objeto até a menor das partículas, Ele deve ser confessado como o único Criador e Deus.

“Todavia para nós há um só Deus, o Pai, de quem é tudo e para quem nós vivemos; e um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual são todas as coisas, e nós por ele”. 1 Coríntios 8:6

Ele existe de uma maneira diferente de nós: nós, criaturas suas, existimos em forma dependente, derivada, finita e frágil, mas nosso Criador existe cm forma eterna, autossustentada e necessária — necessária, isto é, no sentido de que Deus não tem, por sua imanência, de sair da existência, como, inversamente, não temos em nós a faculdade de viver para sempre. Nós necessariamente envelhecemos e morremos, porque c nossa presente natureza fazer isso; Deus necessariamente continua para sempre imutável, porque é sua natureza eterna fazer isso. Este é um dos muitos contrastes entre a criatura e o Criador.[4]


2. DEUS É SANTO

A confissão da Bíblia sobre a singularidade de Deus também pode ser encontrada na declaração de que Ele é santo:

“E clamavam uns aos outros, dizendo: Santo, Santo, Santo é o Senhor dos Exércitos; toda a terra está cheia da sua glória”. - Isaías 6:3

“E os quatro animais tinham, cada um de per si, seis asas, e ao redor, e por dentro, estavam cheios de olhos; e não descansam nem de dia nem de noite, dizendo: Santo, Santo, Santo, é o Senhor Deus, o Todo-Poderoso, que era, e que é, e que há de vir”. - Apocalipse 4:8

A santidade de Deus significa primeiramente que Ele é completamente diferente da Sua criação. Ele é o Criador, único e em controle completo de tudo o que Ele fez.

Nós, seres humanos, somos limitados no que podemos fazer. Nosso conhecimento é finito, e nunca exaustivo. Nossas vidas nesta terra são relativamente curtas em duração e, frequentemente, perseguidas por experiências dolorosas — “desagradável, brutal e curta”, como o filósofo Thomas Hobbes[5] uma vez descreveu. 

Deus não é assim. Ele é imortal, pode fazer tudo o que a Sua boa vontade decide, e não tem absolutamente nenhuma limitação. Dizer que Deus é santo significa falar da Sua singularidade, da Sua diversidade (ou alteridade) diante da Sua criação.


3. DEUS É ÚNICO

Homens e mulheres adoram a vários deuses. Sempre houve inumeráveis deuses falsos, e o título, “deus”, tem sido aplicado:
a) aos Anjos, Sl 82.1,6
b) Satanás é chamado de deus, 2 Co 4.4
c) Alguns homens já foram tratados como deus – Faraós – e a bíblia faz referência a Herodes Agripa I, que foi tratado como deus, Atos 12.21-23

Deus está na congregação dos poderosos; julga no meio dos deuses.1
Eu disse: Vós sois deuses, e todos vós filhos do Altíssimo.6 Sl 82.1,6

Nos quais o deus deste século cegou os entendimentos dos incrédulos, para que lhes não resplandeça a luz do evangelho da glória de Cristo, que é a imagem de Deus. 2 Co 4:4

“E num dia designado, vestindo Herodes as vestes reais, estava assentado no tribunal e lhes fez uma prática.
E o povo exclamava: Voz de Deus, e não de homem.
E no mesmo instante feriu-o o anjo do Senhor, porque não deu glória a Deus e, comido de bichos, expirou”. Atos 12:21-23

Tendo sido feitos à imagem do Deus verdadeiro, os seres humanos têm um insaciável desejo de adoração (ou prestar culto). Contudo, sendo seres caídos (pelo pecado), os seres humanos inevitavelmente adoram deuses fabricados por eles mesmos.

a) O primeiro deus fabricado pelo homem tinha a forma de um bezerro, Ex 32.1-4.
b) O homem adora os elementos como pedra e madeira (Isaías 44.6-20)
c) O homem adora o próprio homens, At 10.24-26.

1Mas vendo o povo que Moisés tardava em descer do monte, acercou-se de Arão, e disse-lhe: Levanta-te, faze-nos deuses, que vão adiante de nós; porque quanto a este Moisés, o homem que nos tirou da terra do Egito, não sabemos o que lhe sucedeu.
2E Arão lhes disse: Arrancai os pendentes de ouro, que estão nas orelhas de vossas mulheres, e de vossos filhos, e de vossas filhas, e trazei-mos.
3Então todo o povo arrancou os pendentes de ouro, que estavam nas suas orelhas, e os trouxeram a Arão.
4E ele os tomou das suas mãos, e trabalhou o ouro com um buril, e fez dele um bezerro de fundição. Então disseram: Este é teu deus, ó Israel, que te tirou da terra do Egito. Êxodo 32:1-4

(...) Isaías 44.6-20

24E no dia imediato chegaram a Cesaréia. E Cornélio os estava esperando, tendo já convidado os seus parentes e amigos mais íntimos.
25E aconteceu que, entrando Pedro, saiu Cornélio a recebê-lo, e, prostrando-se a seus pés o adorou.
26Mas Pedro o levantou, dizendo: Levanta-te, que eu também sou homem. Atos 10:24-26

João Calvino, o Reformador Francês, apontou precisamente que a mente humana é “uma perpétua fábrica de ídolos”. [6] (Rm 1:18-25).

18Porque do céu se manifesta a ira de Deus sobre toda a impiedade e injustiça dos homens, que detêm a verdade em injustiça.
19Porquanto o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta, porque Deus lho manifestou.
20Porque as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, tanto o seu eterno poder, como a sua divindade, se entendem, e claramente se vêem pelas coisas que estão criadas, para que eles fiquem inescusáveis;
21Porquanto, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes em seus discursos se desvaneceram, e o seu coração insensato se obscureceu.
22Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos.
23E mudaram a glória do Deus incorruptível em semelhança da imagem de homem corruptível, e de aves, e de quadrúpedes, e de répteis.
24Por isso também Deus os entregou às concupiscências de seus corações, à imundícia, para desonrarem seus corpos entre si;
25Pois mudaram a verdade de Deus em mentira, e honraram e serviram mais a criatura do que o Criador, que é bendito eternamente. Amém. Romanos 1:18-25

O único remédio é a dádiva da visão espiritual, por parte de Deus, onde é concedido como que um raio de luz do céu, e as pessoas são despertadas para conhecerem ao Deus verdadeiro, e para conhecerem a si mesmas como Suas criaturas.


CONCLUSÃO

Deus é, portanto, soberano sobre a Sua criação. Ele concede vida e tira a vida, levanta nações e montanhas, e também as rebaixa, traz sóis para a luz, e os estingue. Nada pode detê-Lo. O que Ele decide, certamente acontece, e neste exercício de soberania está a Sua glória.

Os seres humanos têm o privilégio e a responsabilidade de reconhecer esta soberania de Deus. Contudo, eles só podem fazer isto quando Deus inclina os seus corações. Por natureza, eles são rebeldes, desprezando a Sua autoridade, e agindo contra o que eles instintivamente sabem, e também declarando que Deus não existe.

Contudo, Ele existe sim! O cristão tem mais certeza disto do que qualquer outra coisa que ele ou ela saiba. Assim, o “doce deleite”[7] (emprestando uma frase de Jonathan Edwards, o pregador evangélico do século XVIII) do cristão é submeter-se a este grande Deus, reconhecendo a sua total dependência Dele, e vivendo para Ele e para a Sua glória.

Portanto, o discurso cristão sobre Deus é muito mais do que uma discussão filosófica sobre a Sua existência. É o próprio deleite, para o cristão, vir a conhecer o único e verdadeiro Deus, e conhecendo-O, encontrar significado para a vida e, certamente, a vida eterna (1João 5:20) – na qual o cristão vai desfrutar eternamente o conhecimento, o amor e a comunhão com o Deus triuno, tendo gozo no Seu sorriso e banqueteando na Sua presença.





[1] Confissão de Fé de Westminster comentada por A. A. Hodge. São Paulo: Editora Os Puritanos, 1999
[2] Versículos da Seção I - Dt. 6:4; I Co 8:4, 6; I Ts 1:9; Jr. 10:10; Jó 11:79; Jó 26:14; Jo 6:24; I Tm. 1:17; Dt. 4:15-16; Lc. 24:39; At. 14:11, 15; Tg 1:17; I Re 8:27; Sl. 92:2; Sl. 145:3; Gn. 17:1; Rm. 16:27; Is. 6:3; Sl. 115:3; Ex 3:14; Ef. 1:11; Pv. 16:4; Rm 11:36; Ap. 4:11; I Jo 4:8; Ex 36:6-7; Hb. 11:6; Ne 9:32-33; Sl. 5:5-6; Na 1:2-3.
[3] Versículos da Seção II - Jo 5:26; At. 7:2; Sl 119:68; I Tm 6: 15; At 17:24-25; Rm 11:36; Ap 4:11; Hb 4:13; Rm 11:33-34; At 15:18; Pv 15:3; Sl 145-17; Ap 5: 12-14.
[4] PACKER, J. I. Teologia Concisa: Um guia de estudos das doutrinas cristãs históricas. São Paulo: Cultura Cristã, 2014, 3ª Ed. p.33
[5] HOBBES, Thomas. Leviatã: Matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil. São Paulo: Edipro, 2015, p. 24
[6] CALVINO, João. A Instituição da Religião Cristã. São Paulo: Editora UNESP, 2008. Volume 1.11.8, p.101
[7] LAWSON, Stevens J. As Firmes Resoluções de Jonathan Edwards. São Paulo: Editora Fiel, 2014, p.148.

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