domingo, 26 de março de 2017

O QUE ACONTECE COM OS ANIMAIS QUE MORREM?



Esta não é uma pergunta frívola. Sabemos que as pessoas se tornam muito ligadas aos animais, particularmente seus animais de estimação. A menininha com o seu gato, o homem e o seu cachorro, todos demonstram uma afeição muito humana que passa entre humanos e animais.


Tradicionalmente muitos têm sido persuadidos de que há vida futura para os animais. A Bíblia não ensina explicitamente que os animais vão para o céu. Um dos argumentos chaves contra a idéia de que os animais não sobrevivem à sepultura, é a convicção de que os animais não têm alma. Muitos estão convencidos de que o aspecto distintivo que divide os humanos dos animais, é o fato de que os humanos têm alma, e os animais não. Alguns localizam a imagem de Deus no homem, na alma.

Da mesma forma presume-se que os animais não podem pensar como nós. Suas respostas são explicadas através dos instintos, e não através das formas mais baixas de cognição.

Entretanto o termo instinto é, em si, em estudo em ambiguidade. Quando um instinto se torna pensamento? Os animais podem demonstrar o que chamamos de emoção. Eles sem dúvida respondem a estímulos externos.

A bíblia não diz que os animais pensam. A bíblia não diz que os animais têm alma. Mas, do outro lado, a Bíblia não nega estas coisas. Para dizer a verdade, a bíblia diz que “o boi conhece o seu possuidor, e o jumento a manjedoura do seu dono” (Isaías 1:3). Aquis e refere “conhecimento” ao animal. Entretanto, a passagem poderia ser interpretada metafórica ou poeticamente, portanto, permanecemos incertos.

De uma coisa estamos certos: biblicamente a redenção è explicada em termos cósmicos. Assim como toda a criação foi lançada na ruína pela queda do homem, assim toda criação geme juntamente aguardando a redenção:

“Porque a ardente expectação da criatura espera a manifestação dos filhos de Deus. Porque a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua vontade, mas por causa do que a sujeitou, Na esperança de que também a mesma criatura será libertada da servidão da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus.” (Romanos 8:19-21)

Imagens do céu e da redenção futura incluem animais. O cordeiro, o leão, o lobo, todos são mencionados (Is 11.6; 65.25). Novamente estas imagens podem ser somente ilustrações metafóricas. Mas, tomada em conjunto com a promessa de uma redenção cósmica, elas nos dão alguma esperança real da redenção futura dos companheiros animais dos homens.


SPROUL, R. C. Surpreendido pelo Sofrimento. São Paulo: Cultura Cristã, 1998, p. 182-183.

quarta-feira, 15 de março de 2017

LUCAS - INTRODUÇÃO E COMENTÁRIOS [Cultura Bíblica]


INTRODUÇÃO

Ate muito recentemente, parece que muita pouca atenção foi prestada ao fato notável que Lucas é o único dos quatro Evangelistas que escreveu uma seqüela ao seu Evangelho. Por que fez assim? Os outros três escreveram livros que se concentravam na vida, na morte e na ressurreição de Jesus. Evidentemente sentiam que esta historia podia ficar em pé sozinha; não precisava de suplemento. Mas Lucas escreveu Atos. Por que?

Seu segundo volume, como se sabe, nos leva adiante para a história da igreja primitiva. Conta-nos daqueles primeiros dias em Jerusalém e da maneira como os pregadores levaram o evangelho ao mundo, Pedro e João, Estevão o mártir, Filipe e outros, mas especialmente Paulo e seus cooperadores.

O grande pensamento que Lucas esta expressando é, decerto, que Deus está operando Seu propósito. Este propósito é visto claramente na vida e na obra de Jesus, mas não terminou juntamente com o ministério terrestre de Jesus. Continuou diretamente na vida e no testemunho da igreja. A igreja não representa um novo ato de Deus, completamente sem relação com aquele. Lucas esta dizendo, segundo parece, que a obra de Jesus levou à vida da igreja, conforme o plano de Deus determinou que levasse.

Lucas entende que este propósito divino está intimamente vinculado com o amor e a misericórdia de Deus. Um aspecto característico deste Evangelho é o modo segundo o qual o amor de Deus é retratado como estando ativo de varias maneiras, entre uma variedade de pessoas. Este não é um tema ocasional, mas, sim, um que percorre a totalidade deste escrito. O escritor obviamente era um homem de cultura, com uma apreciação do belo, e certamente sabia escrever bem. Mas não é qualquer destes aspectos, nem a totalidade deles, que explica a beleza deste escrito. Pelo contrário, é a maneira em que o amor de Deus aparece brilhando nas parábolas, nos ditos, e na historia de Jesus.

O tema de Lucas e grandioso, e é tratado em toda a sua extensão. Seu Evangelho é o mais longo dos quatro e, quando Atos é acrescentado, escreveu uma parte do Novo Testamento maior do que qualquer outro autor individual. E claro que um  estudo dos seus escritos é importante para o estudante do Novo Testamento.

I. AUTORIA

Usualmente concorda-se que o autor deste Evangelho deve ser identificado com o escritor de Atos. O Prefacio de Lucas (1 :1-4) e endereçado a Teófilo e Atos 1:1 parece ser um tipo de prefacio secundário. É endereçado à mesma pessoa e visa, aparentemente, relembrar o primeiro. O estilo e o vocabulário favorecem a unidade da autoria. A tradição concorda com o Prefácio, que nos mostra que o autor não era testemunha ocular das coisas que registra, mas que pesquisara evidências da parte de tais pessoas. Era claramente um escritor cuidadoso e um homem de cultura, mas não um dos primeiros seguidores de Jesus.

II. A DATA

Três datas têm sido sugerido para este Evangelho com certa seriedade, a saber: cerca de 63 d.C., cerca de 75-85 d.C., e no começo do século II. A data está vinculada com a de Atos, pois Lucas deve forcosamente ser anterior a sua seqüela.

III. LINGUAGEM

Linguisticamente, este Evangelho divide-se em três seções. O Prefácio (1:1-4) e escrito num bom estilo clássico. Demonstra aquilo que Lucas sabia fazer, mas a partir de então, abandona totalmente este estilo. O resto do capítulo 1 e o capítulo 2 têm um sabor nitidamente hebraico. É tão marcante que certo número de estudiosos chegou à conclusão de que aqui temos uma tradução de um original em hebraico.

A partir de 3:1, o Evangelho está escrito num tipo de grego helenístico que relembra fortemente a Septuaginta, versão grega do Antigo Testamento hebraico. Conforme
E. Earle Ellis indica, “é difícil ver por que a historia da igreja palestiniana (At 1-12) deveria ter mais “sabor” [semítico] do que a missão de Jesus na Galiléia ou o discurso de Paulo em Jerusalém (At 22). Parece muito mais provável que em tais trechos Lucas esta seguindo de perto suas fontes semíticas.

IV. LUCAS O TEÓLOGO

Lucas agora é geralmente considerado um dos teólogos do Novo Testamento e é visto como sendo mais interessado em transmitir verdades religiosas e teológicas do que em escrever uma historia. De fato, o pêndulo avançou tanto nesta direção que muitos sugerem que o interesse de Lucas na teologia era tão grande que permitiu que afetasse seu juízo histórico. Noutras palavras, dizem que Lucas estava disposto a alterar um pouco a sua historia se isto ressaltasse suas lições teológicas.

O propósito religioso e teológico, podemos ver algo desse propósito nos tópicos que se seguem.

1. A história da salvação. Coloca sua narrativa no contexto da historia secular mais firmemente do que qualquer dos demais Evangelistas (2:1-2; 3:1), e vê a ação de Deus em Cristo como sendo a grande intervenção central de Deus nos assuntos dos homens, mediante a qual a salvação do homem e operada (Atos 2:36; 4:10-12;17:30-31).

2. A universalidade da salvação. Vemos a largura desse grande amor de Deus na universalidade da salvação acerca da qual Lucas escreve. A própria palavra “salvação” esta ausente de Mateus e Marcos e ocorre uma só vez em João. Lucas, no entanto, empregou soteria quatro vezes e soterion duas vezes (outros sete exemplos das duas palavras ocorrem em Atos, num total de treze). Além disto, emprega o termo “Salvador” duas vezes (e duas vezes mais em Atos), e empregou o verbo “salvar” mais freqüentemente do que qualquer outro Evangelista.

3. A escatologia. Lucas escreve acerca de uma grande salvação, de uma salvação que e valida por toda a eternidade e não somente para o tempo. Alguns estudiosos, é verdade, sustentam que ele negligencia o tema escatológico. Os demais Evangelhos, sustentam eles, foram escritos com a expectativa que Cristo voltaria dentro em breve e que estabeleceria o reino de Deus, expectativa esta que foi compartilhada por Paulo e outros. Lucas, porem, escreve quando a expectativa vivida tinha desvanecido. Para ele, a volta de Cristo já não é iminente. “Ninguém escreve a historia da igreja se está esperando diariamente o fim do mundo.”

4. O catolicismo primitivo. Alguns deixam de entender o impacto daquilo que Lucas esta dizendo quando sustentam que ele institucionalizou o cristianismo, ou, pelo menos, que escreve como representante da religião institucional. O resultado é chamado “catolicismo primitivo” por muitos estudiosos, e vêem Lucas como sendo um dos seus primeiros expositores.

5. O plano de Deus. Lucas viu que Deus estava desenvolvendo um grande plano nos negócios dos homens. Já notamos seu uso freqüente de varias palavras para denotar “propósito” a fim de ressaltar o conceito de uma necessidade divina operante no ministério de Jesus. O propósito foi visto supremamente na cruz (Atos 2:23; 3:13; 5:30-31, etc.). O Deus a quem Lucas conhece está interessado na salvação dos homens, e está constantemente operativo nos negócios dos homens a fim de levar a efeito Seu propósito redentor.

6. Os indivíduos. Ao operar aquele grande propósito da redenção, Deus, segundo o conceito de Lucas, preocupava-Se com os homens. Não pensava que o propósito divino aparecia somente nos grandes movimentos das nações e dos povos: operava nas vidas de homens e mulheres humildes, pois Deus Se importa também com as pessoas de menos influencia.

7. A importância das mulheres. Uma parte importante da solicitude que Deus tem para com as pessoas e que e manifestada para com grupos que não eram altamente estimados na sociedade do século I: as mulheres, as crianças, os pobres, os de ma fama.Por exemplo, da um lugar de relevância as mulheres. No século I, as mulheres eram mantidas bem no seu lugar, Lucas, porem, vê-as como objetos do amor de Deus, e escreve acerca de muitas delas. Nas historias da Infância, conta de Maria, mãe de Jesus, e de Isabel e Ana. Mais tarde, escreve também de Marta e da sua irmã Maria (10:38-42), de Maria Madalena e Joana e Susana (8:2-3). Refere-se a mulheres que não menciona pelo nome, tais como a viúva de Naim (7:11-12), a pecadora que ungiu os pés de Jesus (7:37ss.), a pequena velha encurvada (13:11), a viúva que deu a Deus tudo quanto tinha (21:14) e as “Filhas de Jerusalém” que lamentavam por Jesus enquanto Ele subia a cruz (23:27ss.). Às vezes, as mulheres aparecem também nas parábolas, como naquela da moeda perdida (15:8ss.) ou do juiz injusto (18:1 ss.).

8. As Crianças. O exemplo mais óbvio da solicitude de Lucas para com as crianças é o das narrativas da infância. Naturalmente, o interesse pelas crianças não é a única razão destas histórias. Lucas está preocupado em enfatizar que o plano de Deus estava sendo cumprido no nascimento e na juventude de João e de Jesus.

9. Os pobres. Jesus veio pregar o evangelho aos pobres (4:18), e é digno de nota que Lucas relata uma bem-aventurança para os pobres (6:20; há, por contraste, um ai para os ricos, 6:24), ao passo que Mateus fala dos “pobres de espírito” (Mt 5:3). Pregar as boas-novas aos pobres é característica do ministério de Jesus (7:22). Os pastores, aos quais vieram os anjos (2:7ss.) pertenciam a uma classe pobre. Na realidade, parece que a família do próprio Jesus era pobre, pois a oferta feita na ocasião do nascimento da Criança era a dos pobres (2:24; cf. Lv 12:8). De modo geral, Lucas preocupa-se com os interesses dos pobres (1:53; 6:30; 14:11-13, 21; 16:19ss.).

10. Os de má fama. Lucas nos conta que em certa ocasião “Aproximavam-se de Jesus todos os publicanos e pecadores para o ouvir” (15:1). Este não e um incidente, isolado no Terceiro Evangelho, pois Lucas tem a oportunidade de mencionar muitas pessoas que não eram muito respeitáveis. O filho pródigo não era exatamente um modelo da retidão, e os injustos têm um jeito de aparecerem nas parábolas neste Evangelho (7:41-42; 12:13-21; 16:1-12, 19-31; 18:1-8,9-14).

11. A Paixão de Cristo. O propósito de Deus é supremamente realizado na paixão de nosso Senhor. Lucas escreve com a convicção de que Deus agiu em Cristo para trazer a salvação aos homens.

12. O Espírito Santo. O propósito de Deus não cessa na cruz. Continua na obra do Espírito Santo, que significava tanta coisa na igreja dos dias de Lucas. O interesse deste Evangelista pelo Espírito, no entanto, remonta aos dias iniciais. O Espírito e destacado neste Evangelho desde o início. Há uma profecia no sentido de que João seria cheio do Espírito Santo, já do ventre materno (1:15), ao passo que se diz de Isabel bem como de Zacarias que ficaram cheios do Espírito (1:41, 67). O mesmo Espírito estava “sobre” Simeão, revelou-lhe que haveria de ver o Cristo, e o guiou para o Templo no momento apropriado (2:25-27).

O Espírito Santo estava ativo em conexão com o ministério de Jesus. Este fato remonta até a concepção original, pois o anjo Gabriel informou Maria que “Descerá sobre ti o Espírito Santo e o poder do Altíssimo te envolverá com a sua sombra” (1:35). Quando Jesus estava para começar Seu ministério, há várias referências ao Espírito Santo. João Batista profetizou que Jesus batizaria com o Espírito Santo e com fogo (3:16). Quando nosso Senhor foi batizado, o Espírito Santo veio sobre Ele “em forma corpórea como pomba” (3:22), e o mesmo Espírito O encheu e O guiou para o deserto na ocasião da tentação (4:1). Depois de terminada a tentação, e Ele estava para entrar no Seu ministério, “Jesus, no poder do Espírito, regressou para a Galiléia” (4:14). Depois, quando pregou na sinagoga de Nazaré, Jesus aplicou a Si mesmo as palavras: “O Espírito do Senhor está sobre mim” (4:18), Não há muitas referências ao Espírito durante o ministério, mas em certa ocasião Jesus “exultou no Espírito Santo” (10:21) e provavelmente devamos entender que isto indica que o Espírito estava continuamente com Ele. Além disto, disse aos Seus seguidores que, nas emergências, o Espírito Santo lhes ensinaria as coisas que deveriam dizer (12:12), e não e fácil pensar que eles teriam o Espírito Santo e Jesus, não. A blasfêmia contra o Espírito e o mais grave dos pecados (12:10). Jesus disse a Seus discípulos que o Pai daria o Espírito Santo aqueles que lho pedirem (11:13). Depois da ressurreição, disse: “Eis que envio sobre vos a promessa de meu Pai” e passou a assegurar os discípulos que seriam “revestidos de poder do alto” (24:49). Esta e uma clara referencia a vinda do Espírito Santo, profecia esta que foi cumprida no Pentecoste.

Mas, por mais importante que seja o ensino deste Evangelho acerca do Espírito Santo, é em Atos que recebemos o impacto total da ênfase de Lucas. Aquele livro esta cheio do Espírito, e tem sido chamado, com razão, “Os Atos do Espírito Santo.” O Espírito esta constantemente operante desde o Dia do Pentecoste.

Está abundantemente claro, pois, que uma das grandes ênfases de Lucas é o Espírito Santo. Não pensa que Deus deixa os homens para servi-Lo da melhor maneira que podem com seus próprios recursos. O amor de Deus é visto no Espírito que entra nos seguidores de Jesus e lhes dá poder e os guia.

Alguns têm visto a ênfase dada por Lucas ao Espírito Santo como substituto da escatologia que significa tanta coisa para os demais Evangelistas. Helmut Flender nota o argumento de Conzelmann e Schweizer de que a historia da redenção e a escatologia são mutuamente exclusivas. Contra isto, argumenta (com razão, segundo meu juízo) que este não e um modo verdadeiro de entender a obra do Espírito. Flender vê a exaltação de Cristo e o derramamento do Espírito como eventos escatológicos genuínos, mas nega que isto torne a igreja “igualmente escatológica.” Continua: “Entender a historia da redenção desta maneira seria confundir a atividade divina com a humana, que seria intolerável. Quando falamos do Espírito como sendo escatológico, queremos dizer que é escatologia tornada presente.” O que garante o senso genuíno da iminência, da expectativa continua, é que o dom do Espírito não é alguma coisa institucional, como se a igreja tivesse o Espírito sob seu controle e pudesse produzir os dons do Espírito em qualquer momento que escolhesse. O Espírito Santo foi dado no Pentecoste, decerto, mas Ele podia encher as mesmas pessoas outra vez, um pouco mais tarde, como resposta a oração (Atos 4:31). A presença do Espírito “ainda é um dom sobrenatural, pelo qual os fieis devem esperar, e que devem ser prontos para receber.” Não se pode tratar o Espírito com presunção. A igreja não pode dizer: “Temos o Espírito em nossa salvaguarda. Não precisamos esperar a vinda de nosso Senhor.”

O Senhorio do Espírito sobre o processo histórico é amplamente ressaltado em Atos. E, conforme notamos numa seção anterior, Lucas tem mais para dizer acerca do Espírito no seu Evangelho do que qualquer um dos demais Evangelistas. Isto forma um vinculo de continuidade. Tanto no ministério de Jesus quanto na vida da igreja primitiva, o Espírito de Deus esta operante.

13. A oração. No seu ensino acerca do Espírito, portanto, Lucas nos mostra que Deus leva a efeito o Seu propósito. Esta operação exige uma atitude certa da parte do povo de Deus, e é de acordo com isto que Lucas ressalta a importância da oração. Ha duas maneiras principais de ressaltar este interesse. A primeira é ao registrar as orações de Jesus (3:21;5:16; 6:12; 9:18, 28-29; 10:21-22; 11:1; 22:41ss.; 23:46; sete destas constam somente em Lucas, e mostram Jesus orando antes de cada grande crise da Sua vida).

14. O louvor. O Evangelho segundo Lucas é um Evangelho cantante. Registra alguns dos grandes hinos da fé crista': o cântico de gloria dos anjos (2:14), o Magnificat, o Benedktus e o Nunc Dimittis (1:46ss., 68ss.; 2:29ss.)

Fica claro, com tudo isto, que Lucas escreveu com um propósito profundamente teológico. Vê Deus operando para trazer a salvação e tem prazer em ressaltar uma variedade dos aspectos desta grande obra salvífica.

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Lucas: Introdução e Comentário. Leon Morris. São Paulo: Edições Vida Nova, 2007, p. 11-45.

quarta-feira, 8 de março de 2017

A HEROICA OUSADIA DE MARTINHO LUTERO


Deus tem levantado, através dos séculos, uma longa linhagem de homens piedosos, os quais ele usa de modo poderoso em momentos críticos da história da igreja. Essas pessoas valorosas vieram de todos os setores da vida – desde as mansões de universidades de elite cobertas de hera, até as salas dos fundos de comerciantes mais humildes. Surgiram de todos os cantos deste mundo – desde locais de alta visibilidade nas cidades mais populosas até os vilarejos obscuros das regiões mais remotas. Apesar dessas diferenças, esses indivíduos centrais, troféus da graça divina, têm muito em comum entre eles.

Com certeza cada um tinha firme fé em Deus e no Senhor Jesus Cristo, mas podemos dizer muito mais que isso. Eles tinham fortes convicções quanto às verdades que exaltam a Deus, conhecidas como as doutrinas da graça. Embora fossem diferentes em questões teológicas secundárias, firmavam-se ombro a ombro na defesa das doutrinas que glorificam a graça soberana de Deus em seus propósitos salvíficos para o mundo. Cada qual manteve a verdade essencial de que “do Senhor é a salvação” (Sl 3.8; Jn 2.9)

Como essas verdades afetaram a vida deles? Longe de paralisá-los, as doutrinas da graça inflamaram seus corações com reverente respeito a Deus e produziram almas humildes diante do trono divino. Além do mais, a verdade da graça soberana os tornou ousados na divulgação na causa de Cristo sobre a terra. Este fato não deveria nos surpreender, pois a história revela que aqueles que assumem estas verdades recebem extraordinária confiança em seu Deus. Com uma visão alargada, eles avançam, realizando a obra de muitos homens, deixando uma influência piedosa sobre gerações futuras. Sobem com asas como de águias e sobrevoam seu tempo na história. A experiência mostra que as doutrinas da graça renovam seu espírito e lhes infundem poder para servir a Deus em seu tempo divinamente designados.

A série “Um Perfil de Homens Piedosos! Procura ressaltar figuras-chaves dessa sucessão de homens que crêem na graça soberana de Deus. O propósito da série é examinar como tais homens usaram seus dons e suas habilidades, dados por Deus, para expandir o reino do céu. Porque eram firmes seguidores de Cristo, os seus exemplos são dignos de serem imitados hoje.

O famoso reformador alemão Martinho Lutero é o foco deste volume. Numa época em que a igreja precisava com urgência ouvir a verdade, a voz de Lutero trovejava com santa ousadia por toda a Europa. Em meio ao declínio doutrinário daquele tempo, Lutero falou com coragem, afirmando um resoluto compromisso com a Escritura. O reformador estava cheio de coragem audaz quando confrontou a igreja de Roma, por ela ter se desviado do verdadeiro evangelho da salvação. Seu compromisso singular com a verdade da Bíblia se tornou a força motriz por trás da Reforma. À medida que o Senhor fortalecia Lutero, o seu púlpito tornou-se um dos clarins mais nítidos da palavra de Deus que este mundo testemunhou. Por estas razões, o perfil de Lutero permanece eminentemente digno de ser traçado.

Que o Senhor use este livro para torná-lo mais corajoso para que, como Lutero, e para a glória de Deus, você deixe sua marca indelével sobre este mundo. Que por meio deste perfil você seja fortalecido ao andar de modo digno de sua vocação. Que esteja pleno da Escritura, e assim, seja ousado em seu ministério para Cristo.

sábado, 4 de março de 2017

SUICÍDIO


Historicamente a igreja tem assumido uma posição contrária ao suicídio. Entretanto permanecemos com o fato de que muitas pessoas, de fato, se matam.

Certa vez me perguntaram, num programa de entrevistas na televisão, se as pessoas que cometem suicídio podem ir para o céu. Respondi com um simples “sim.” Minha resposta fez com que as luzes do painel da estação brilhassem como uma árvore de Natal. O entrevistador ficou chocado com minha resposta. Expliquei que o suicídio não é identificado em lugar nenhum com o pecado imperdoável.

Não temos certeza sobre o que está se passando na mente de uma pessoa no momento do suicídio. É possível que o suicídio seja um ato de pura falta de fé, uma rendição ao desespero total que indica a falta de qualquer fé em Deus. De outro lado pode ser sinal de uma doença mental temporária ou prolongada. Pode ser resultado de uma súbita onda de depressão severa (tal depressão pode, em alguns casos, ser provocada por causas orgânicas, ou pelo uso não intencional de certos remédios).

Um psiquiatra observou que a grande maioria das pessoas que comete suicídio não o faria se tivesse esperado vinte quatro horas. Tal observação é conjectura, mas é uma conjectura baseada em numerosas entrevistas com pessoas que fizeram sérias tentativas de suicídio, mas falharam, e conseqüentemente se recuperaram.

O fato é que as pessoas cometem suicídio por uma grande variedade de razões. A complexidade do processo de pensamento da pessoa no momento do suicídio, é conhecido em sua inteireza apenas por Deus. Deus leva em conta todas as circunstâncias atenuantes quando pronuncia seu julgamento sobre qualquer pessoa.

Embora devamos procurar desencorajar a pessoa de suicidar-se, deixemos aqueles que o fizeram entregues à misericórdia de Deus.

Soren Kierkegaard escreveu certa vez que uma das experiências mais angustiantes da vida é desejar morrer e não ter permissão para isto. O suicídio não é permitido por Deus. A hora de nossa morte está nas mãos de Deus. Não devemos tomar providências ára apressar o momento de nossa partida. Deus é o autor da vida e o soberano sobre ambos, a vida e a morte. Podemos orar por nossa própria morte, mas o pedido só pode ser atendido por Deus e somente por Deus.

SPROUL, R. C. Surpreendido pelo Sofrimento. São Paulo: Cultura Cristã, 1998, p. 178-180.

CREIO: UM ESTUDO SOBRE AS VERDADES ESSENCIAIS DA FÉ CRISTÃ.


Muitos cristãos têm consciência da necessidade de aprofundar seu entendimento do evangelho. Muitas vezes, aqueles que acabaram de abraçar a fé querem que alguém os ajude a entender melhor o cristianismo. Com freqüência, porém, cristãos mais experientes, cônscios de sua falta de conhecimento e compreensão de pontos importantes da fé, sentem a mesma necessidade. A existência de inúmeros grupos de estudos cristãos, que se reúnem em igrejas e lares por todo o mundo, revelam essa necessidade. No calendário da igreja, a época da Quaresma (período entre a (Quarta-Feira de Cinzas e a Páscoa) costuma ser separada para a reunião desses grupos, o que não raro atrai cristãos com diferentes formações para estudar e aprender juntos. O problema desses grupos, porém, é que em geral têm dificuldades para decidir o que estudar. Enfrentam problemas para definir um programa.

Na realidade, poucos assuntos dariam um objeto de estudo melhor para tais grupos que o Credo Apostólico. O Credo apresenta um breve resumo de muitos dos pontos principais da fé cristã e é conhecido de muitos crentes, já acostumados a usá-lo no culto dominical. Este livro foi concebido para ser um guia de estudos do Credo Apostólico e pode ser facilmente adaptado para uso nas seis semanas da Quaresma, mas também é adequado a qualquer outro período. Espero que este trabalho ajude você a refletir sobre algumas áreas de sua fé e a aprofundar seu entendimento daquilo em que crê. A fé, na verdade, é “adquirida, não ensinada”, mas ela vai além de confiar em Deus. Uma fé que permanece nesse nível é imatura e superficial, vulnerável à dúvida e pouco útil para a evangelização. É difícil explicar o cristianismo a alguém de fora se você mesmo nunca refletiu muito sobre ele. É claro que os cristãos confiam em Deus, mas temos convicções bastante específicas a respeito dele e sobre o impacto que elas devem ter sobre nós, os crentes. O Credo Apostólico é um ponto de partida ideal nesse processo imprescindível de consolidação do entendimento de sua fé.

O significado da palavra credo

Muitas palavras da língua inglesa têm origem no latim, sobretudo no caso das palavras relacionadas ao cristianismo. Durante mais de mil anos, o latim foi a língua dos cristãos instruídos. Não é de estranhar que um bom número de palavras do inglês provenha do latim. Um bom exemplo é o nome Maundy Thursday [Quinta-Feira Santa], o dia imediatamente anterior à Sexta-Feira da Paixão, em que os cristãos por tradição voltam os pensamentos para a Última Ceia. Na Idade Média, os cultos da igreja sempre se realizavam em latim, e o texto escolhido para iniciar a celebração da Última Ceia era João 13.34: “Um novo mandamento vos dou: Que vos ameis uns aos outros; como eu vos amei a vós, que também vós uns aos outros vos ameis” (ARC). Em latim, esse texto começa com as palavras “Mandatum novum do vobis [Mandamento novo vos dou]”. A palavra inglesa Maundy deriva do primeiro vocábulo pronunciado nesse culto: mandatum, “mandamento”.

Aconteceu exatamente a mesma coisa com a palavra credo. Durante mais de mil anos, os cristãos da Europa ocidental só conheciam o Credo Apostólico em latim, cujas primeiras palavras são Credo in Deum, ou “Creio em Deus”. Talvez você esteja habituado a essas palavras latinas, ou a algumas muito parecidas encontradas em obras para corais de compositores como Bach, Haydn, Mozart ou Beethoven. O termo “credo” em nosso idioma é a própria palavra latina credo. Como essa palavra indica, trata-se de uma declaração de fé. É uma tentativa de resumir os pontos principais daquilo em que os cristãos creem. Não é um texto exaustivo, nem é essa sua intenção.

As origens dos credos

As origens do Credo Apostólico podem ser encontradas no próprio Novo Testamento. São freqüentes as menções a ser “batizado em nome de Jesus Cristo” (ver At 2.38; 8.12; 10.48) ou “em nome do Senhor Jesus” (At 8.16; 19.5). Parece que a forma mais simples do primeiro credo cristão foi apenas “Jesus é o Senhor” (Rm 10.9; 1Co 12.3; 2Co 4.5; Fp 2.11). Qualquer um que fizesse essa declaração era considerado cristão.

Cristão é aquele que “[recebeu] Cristo Jesus, o Senhor” (Cl 2.6). Essa declaração é vigorosa, pois implica duas afirmações conexas. Em primeiro lugar, confessa a lealdade do crente a Jesus Cristo e seu compromisso com ele. Como veremos mais adiante, quando alguém confessa que “Jesus Cristo é o Senhor”, isso equivale a declarar que Jesus é o Senhor de sua vida. Reconhecer que Jesus é o Senhor significa buscar seguir a vontade dele. A recusa dos primeiros cristãos a adorar o imperador romano reflete a convicção de que só é possível servir a um senhor e, para o cristão, esse senhor é o próprio Jesus, e somente ele. Em segundo lugar, “Jesus é o Senhor” afirma determinadas informações acerca de Jesus, sobretudo sobre sua ligação com Deus.

Entretanto, com o passar do tempo, foi necessário explicar com mais detalhes aquilo em que os cristãos criam. Era preciso explicar tudo o que implicava declarar “Jesus é o Senhor”. O que os cristãos criam com relação a Deus? E sobre Jesus? E o Espírito Santo? No quarto século, o Credo Apostólico como o conhecemos hoje já tinha adquirido uma fórmula mais ou menos fixa. As variações que existissem eram sutis e, mesmo estas, acabaram por ser eliminadas no sétimo século. O Credo Apostólico é um resumo excelente dos ensinos dos apóstolos acerca do evangelho, apesar de não ter sido de fato escrito pelos apóstolos.

Quando alguém se tornava cristão na igreja primitiva, seu batismo era imbuído de grande importância. No período da Quaresma, os recém-convertidos à fé eram instruídos nas convicções cristãs. Ao fim desse processo, quando já dominavam os fundamentos da fé, recitavam o Credo juntos, num testemunho coletivo da fé que professavam — e agora entendiam. A fé tinha sido reforçada pelo entendimento. Em seguida, todos eram batizados de forma solene e com muita alegria no próprio dia de Páscoa, quando a igreja celebrava a ressurreição de seu Senhor e Salvador. Dessa forma, a importância do batismo do crente podia ser plenamente compreendida: ele havia passado da morte para a vida (Rm 6.3-10). O batismo era uma demonstração pública de que o fiel morrera para o mundo e nascera para uma nova vida em Jesus Cristo.

Uma parte fundamental da celebração do batismo era a pública profissão de fé de cada candidato. Quem desejasse ser batizado tinha de professar publicamente sua fé em Jesus Cristo. Em muitos momentos da história da igreja, isso foi extraordinariamente perigoso: confessar-se cristão podia significar prisão, perseguição, sofrimento ou mesmo a morte. (A propósito, a palavra mártir deriva do vocábulo grego mártys, que quer dizer “testemunha”. Ser um mártir era considerado o mais sublime testemunho possível de Jesus Cristo e seu evangelho.) O crente, contudo, não se limitava a recitar um credo. Antes de ser batizado, cada indivíduo era indagado se cria pessoalmente no evangelho. Observe a seguir parte de um sermão pregado no quarto século a recém-batizados que menciona essa prática. (Note as importantes referências a Romanos 6.3,4: aqueles que morreram para seu passado renasceram para uma nova vida em Cristo).

Perguntaram-te: “Crês em Deus Pai todo-poderoso?”. Respondeste: “Creio”, e foste imerso, ou seja, sepultado. Mais uma vez te perguntaram: “Crês em nosso Senhor Jesus Cristo e em sua cruz?”. Respondeste: “Creio”, e foste imerso. Desse modo, foste sepultado com Cristo, pois aquele que com Cristo é sepultado, com ele ressuscita. Uma terceira vez te perguntaram: “Crês no Espírito Santo?”. Respondeste: “Creio”, e foste imerso uma terceira vez. Tua confissão tríplice, portanto, apagou os muitos pecados de tua existência anterior.

Historicamente, portanto, o Credo era a profissão de fé dos convertidos na ocasião do batismo e constituía o fundamento da instrução deles. Agora que mais e mais indivíduos descobrem o cristianismo em idade adulta, o Credo pode voltar a atender a este propósito histórico.

O Credo Apostólico, entretanto, não foi o único credo a surgir no período da igreja primitiva. Duas controvérsias importantes na igreja nascente geraram a necessidade de ser mais preciso acerca de certos aspectos de doutrina. A primeira delas, a controvérsia ariana no quarto século, dizia a respeito à relação entre Jesus e Deus. Com o fim de evitar entendimento insuficiente da relação entre o Pai e o Filho, o Concílio de Calcedônia (451 d.C) apoiou um credo conhecido hoje como o Credo Niceno.  Cerca de duas vezes mais extenso que o Credo Apostólico, ele começa com as palavras “Cremos em um Deus”. No empenho de insistir na divindade de Jesus Cristo, esse Credo afirma que Jesus é “feito de uma só substância com o Pai”.

A segunda controvérsia de maior importância girava em torno da Trindade. Para evitar compreensões equivocadas da relação entre o Pai, o Filho e o Espírito, foi redigido o Credo Atanasiano. Este credo, que iniciava com a frase “Todo aquele que quiser ser salvo”, é de longe o mais extenso dos três. Hoje em dia, raramente é usado em cultos públicos.

Neste livro, vamos concentrar a atenção no Credo Apostólico, o mais simples e mais antigo credo da igreja. Todas as tradições cristãs reconhecem a importância e a autoridade dele como padrão de doutrina. Estudar o Credo Apostólico é investigar um elemento fundamental da herança cristã comum a todos nós. É uma afirmação das convicções básicas que unem os cristãos de todo o mundo e de todos os séculos.

O Objetivo dos credos

Com já vimos, os credos surgiram como uma profissão de fé ou confissão de fé dos convertidos na ocasião de seu batismo. Desde então, eles tem servido para outras finalidades, como, por exemplo, um teste de ortodoxia para líderes cristãos ou ato de louvor num culto cristão. Em nossos dias, os credos têm três finalidades principais.

Em primeiro lugar, eles oferecem um breve resumo da fé cristã. Um credo não é, nem jamais teve intenção de ser, substituto da fé individual. Ele procura dar corpo à fé pessoal que já existe. Ninguém se torna cristão por recitar um credo, mas o credo apresenta uma boa síntese dos principais pontos da fé pessoal. Certos ensinos cristãos não são abordados no Credo. Não há, por exemplo, um parágrafo que declare: “Creio nas Escrituras”. Isso não é necessário, pois o Credo é basicamente um resumo ou uma compilação das principais questões do ensino bíblico referente ao evangelho. A importância da Bíblia é um pressuposto sempre presente; aliás, a maior parte do Credo consiste de citações diretas da Bíblia.

Alguns componentes do Credo talvez pareçam um pouco estranhos ou desconhecidos para os novatos na fé. Não se assuste, isso é apenas para lembrá-lo de que há mais no cristianismo do que você imagina nesse estágio. À medida que vai crescendo na fé, você começa a entender a sabedoria do material que ele contém, por exemplo, sobre a igreja, que muitas vezes parece fora de contexto para os cristãos jovens.

Isso nos traz à segunda finalidade dos credos: permitir-nos reconhecer e evitar versões incompletas ou insuficientes do cristianismo. Por exemplo, alguns talvez insistam que o cristianismo diz respeito sobretudo (quiçá inteiramente) ao Espírito Santo. Outros talvez rejeitem com raiva essa idéia, retorquindo que o cristianismo diz respeito fundamentalmente a Deus Pai. O Credo Apostólico nos lembre de que há muito mais no evangelho que qualquer das visões. Provendo uma abordagem bíblica e equilibrada da fé cristã, testada e comprovada por crentes ao longo dos séculos, o credo nos permite reconhecer as visões incompletas do evangelho. Por exemplo, nenhuma das visões citadas anteriormente faz referencia alguma ao próprio Jesus, o que é uma omissão grave. Elas não são erradas, são apenas insuficientes.

Muitas pessoas tiveram a fé extraordinariamente fortalecida e amadurecida ao serem obrigadas a refletir em áreas da doutrina que jamais teriam estudado som o Credo Apostólico. O Credo deve ser visto como um convite a analisar e descobrir aspectos do evangelho que de outra forma seriam esquecidos ou ignorados. Muitos cristãos evangélicos, por exemplo, costumam ser individualistas, sem nenhum sendo real de pertencer a uma comunidade. Ao afirmar a crença na igreja, o credo nos lembra do aspecto comunitário da doutrina e ajuda a corrigir o individualismo nocivo.

Muitos recém-chegados ao cristianismo querem ser batizados para declarar publicamente sua fé. Uma parte importante da celebração de seu novo nascimento pode ser a declaração congregacional de sua fé coletiva, usando as palavras do Credo Apostólico. Permita que isso lhe sirva de estímulo! Veja no Credo um planejamento para sua investigação pessoal da fé cristã. Considere-o um mapa das áreas que você vai analisar, quer por sua conta própria, quer com outras pessoas. Algumas afirmações do Credo talvez lembrem aqueles mapas antigos, em que grandes partes do globo eram marcadas como terrae incognitae, “território desconhecido”. Encare isso como um desafio! Pode levar algum tempo para você sondar as profundezas de sua fé, mas não há pressa. Espero que este livro lhe sirva de auxílio para começar a explorar sua fé e conhecer a paisagem dela.

Em terceiro lugar, o Credo ressalta quer crer é pertencer. Tornar-se cristão é passar a fazer parte de ma comunidade de fé cuja existência remonta ao Cenáculo, onde Jesus se reuniu com seus discípulos (Jo 21). Ao depositar sua fé em Jesus Cristo, você passou a ser um membro de seu corpo, a igreja, que usa este credo para expressar sua fé. Ao estudá-lo, você está se lembrando dos muitos homens e mulheres que o usaram antes de você. Ele lhe dá um senso de história e perspectiva. Enfatiza que você não é a única pessoa a depositar a confiança em Jesus Cristo. Imagine quantos mais ao longo dos séculos recitaram essas palavras quando foram batizados. Imagine quantos outros encontraram no Credo Apostólico uma confissão de sua fé pessoal. Você faz parte dessa fé e pode compartilhar as mesmas palavras que eles usaram para exprimi-la.

MCGRAFT, Alister E. Creio: um estudo sobre as verdades essenciais da fé cristã no Credo Apostólico. São Paulo: Vida Nova, 2013.

sexta-feira, 3 de março de 2017

O ESTADO INTERMEDIÁRIO



A Bíblia não fala apenas de dois estados da vida humana, mas de três. Existe a vida como a conhecemos na terra. Existe o estado final de nossos futuros corpos ressuscitados. E há o que acontece conosco entre o momento de nossa morte e ressurreição final.

Historicamente a teologia cristã fala de um estado intermediário que se refere à existência pessoal continuada de nossas almas no céu, até que sejam revestidas do corpo glorificado. No estado intermediário, continuamos a existir, vivos, como espíritos sem corpos.

O Cristianismo ortodoxo rejeita a noção de sono da alma que se tornou popular em alguns grupos religiosos. A idéia de sono da alma baseia-se no uso bíblico do termo “dormir” como um eufemismo para a morte. Esta posição ensina que após a morte, as almas dos santos que partiram, permanecem numa espécie de animação suspensa, inconscientes, e sem perceber a passagem do tempo até a grande ressurreição. Esta noção vê uma analogia entre o sono da alma e as experiências de sono que temos nesta vida (sem sonhos). Quando dormimos, temos a sensação de suspensão do tempo enquanto estamos inconscientes.

O Novo testamento não reconhece nenhuma noção de sono da alma. Paulo descreve o estado intermediário como sendo melhor do que esta vida, no sentido de que passamos imediatamente para a presença de Cristo (2 Co 5.8). É difícil imaginar como este estado poderia ser  melhor do que aquele que gozamos agora se permanecemos inconscientes na presença de Cristo

Sem dúvida existe o descanso e a suspensão da dor e do tumulto que sentimos enquanto estamos dormindo, mas a comunhão consciente com Cristo que gozamos presentemente nesta vida não pode ser desprezada. Há ocasiões em que suspiramos por um sonho inconsciente para sentir alivio dos cuidados deste mundo, mas o normal é desejarmos acordar para assumir novamente a vida consciente.

Os lampejos que a Bíblia nos dá sobre o estado intermediário sugerem fortemente um estado de consciência alerta. Embora seja uma parábola cujos elementos não podem ser pressionados demais, a parábola do rico e Lázaro sugere uma aguda consciência de ambos os homens. A parábola envolve uma conversação entre o rico e Abraão. O homem rico, consciente de seu tormento, clama por misericórdia a Abraão. Abraão responde:

“Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro somente males; e agora este é consolado e tu atormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá passar para cá.” [Lucas 16:25,26]

Então o homem rico apela para que uma mensagem seja enviada a seus irmãos que ainda estão vivos, para que eles sejam avisados sobre o lugar de tormento (v. 27-28).

Embora seja uma parábola Jesus pinta a cena do “seio de Abraão” como um lugar intermediário de felicidade consciente, e Hades como um lugar de tormento consciente.

Obviamente a cena tem lugar antes da grande ressurreição. A visão de João registrada no livro de apocalipse inclui cenas dos santos que partira, e esperam o estado final de glória:

“E, havendo aberto o quinto selo, vi debaixo do altar as almas dos que foram mortos por amor da palavra de Deus e por amor do testemunho que deram. E clamavam com grande voz, dizendo: Até quando, ó verdadeiro e santo Dominador, não julgas e vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra? E foram dadas a cada um compridas vestes brancas e foi-lhes dito que repousassem ainda um pouco de tempo, até que também se completasse o número de seus conservos e seus irmãos, que haviam de ser mortos como eles foram. [Apocalipse 6:9-11]

Aqui as almas dos mártires estão claramente em descanso em seu estado intermediário. Mas, este descanso não é um estado de sono inconsciente. É um descanso consciente no qual são capazes de conversar.

SPROUL, R. C. Surpreendido pelo Sofrimento. São Paulo: Cultura Cristã, 1998, p. 97-98.

quinta-feira, 2 de março de 2017

O FOCO EVANGÉLICO DE CHARLES SPURGEON [Prefácio]


Através dos séculos, Deus tem erguido longa fileira de homens piedosos, aqueles a quem ele usa de maneira poderosa em momentos críticos da história da igreja. Esses indivíduos valorosos vieram de todos os tipos de vida – desde prédios cobertos de hera de escolas da elite até empoeiradas salas dos fundos de oficinas de artesãos. Surgiram de todos os pontos do mundo – desde locais altamente visíveis em cidades de densa população até obscuros vilarejos nos lugares mais remotos. No entanto, apesar dessas diferenças, essas figuras centrais, troféus da graça de Deus, têm muito em comum.

Com certeza, cada um desses homens possuía corajosa fé em Deus e no Senhor Jesus Cristo, mas pode-se dizer mais ainda. Cada um tinha profundas convicções quanto às verdades que exaltam a Deus, conhecidas com as doutrinas da graça. Embora diferissem em questões secundárias de teologia, eles andavam ombro a ombro na defesa das doutrinas que exaltam a soberana graça de Deus, em seus propósitos salvíficos para o mundo. Cada um desses homens exaltava a verdade essencial de que “Do Senhor é a salvação” (Sl 3.8; Jn 2.9).

Como essas verdades afetaram a vida deles? Longe de deixá-los inativos, as doutrinas da graça inflamaram seus corações com reverente deslumbramento por Deus e humilhou suas almas diante de seu trono. Além do mais, as verdades da graça soberana deram coragem a esses homens para promover a causa de Cristo sobre a terra. Tal fato não deveria nos surpreender, porque a história revela que aqueles que abarcam essas verdades recebem extraordinária confiança em Deus. Com uma visão maior de Deus, eles dão passos adiante e realizam a obra de muitos homens, deixando uma influência piedosa sobre as gerações futuras. Eles sobem com asas como águias, sobrevoando seus tempos na história. Quanto a experiência, as doutrinas da graça renovam seus espíritos, dando-lhes poder para servir a Deus em suas horas divinamente designadas.

Os perfis de homens piedosos visam ressaltar figuras chaves dessa procissão de homens imbuídos da graça soberana de Deus. O propósito desta série é examinar como essas figuras utilizaram seus dons, dados por Deus, e suas habilidades, para promover o reino do céu. Por ser eles fortes seguidores de Cristo, seus exemplos são dignos de ser imitados hoje.

Neste volume, quero apresentar-lhes o respeitado pregador britânico Charles Haddon Spurgeon. A voz de Spurgeon trovejou com a verdade por toda a Inglaterra e além de lá, em uma época que a igreja tinha necessidade de pregação do evangelho calorosa, franca, sem impedimentos ou barreiras – e isso de uma linha calvinista. Apesar do declínio teológico e metodológico de seus dias, Spurgeon era profundamente dedicado à pregação de Cristo, e Cristo crucificado. À medida que o Senhor lhe dava poder, o seu púlpito se tornou um dos mais profícuos que o Reino de Deus conheceu em todos os tempos. Até os dias atuais, Spurgeon permanece conhecido como o “príncipe dos pregadores”, eminentemente digno de ser estudado nesta série.

Que o Senhor use este livro para dar-lhe profunda ousadia, a fim de que você, como Spurgeon, deixe uma marca indelével sobre este mundo. Que você seja fortalecido pelo evangelho a caminhar de modo digno da vocação a que foi chamado. [Steven J. Lawson – Editor da Série]