sexta-feira, 3 de março de 2017

O ESTADO INTERMEDIÁRIO



A Bíblia não fala apenas de dois estados da vida humana, mas de três. Existe a vida como a conhecemos na terra. Existe o estado final de nossos futuros corpos ressuscitados. E há o que acontece conosco entre o momento de nossa morte e ressurreição final.

Historicamente a teologia cristã fala de um estado intermediário que se refere à existência pessoal continuada de nossas almas no céu, até que sejam revestidas do corpo glorificado. No estado intermediário, continuamos a existir, vivos, como espíritos sem corpos.

O Cristianismo ortodoxo rejeita a noção de sono da alma que se tornou popular em alguns grupos religiosos. A idéia de sono da alma baseia-se no uso bíblico do termo “dormir” como um eufemismo para a morte. Esta posição ensina que após a morte, as almas dos santos que partiram, permanecem numa espécie de animação suspensa, inconscientes, e sem perceber a passagem do tempo até a grande ressurreição. Esta noção vê uma analogia entre o sono da alma e as experiências de sono que temos nesta vida (sem sonhos). Quando dormimos, temos a sensação de suspensão do tempo enquanto estamos inconscientes.

O Novo testamento não reconhece nenhuma noção de sono da alma. Paulo descreve o estado intermediário como sendo melhor do que esta vida, no sentido de que passamos imediatamente para a presença de Cristo (2 Co 5.8). É difícil imaginar como este estado poderia ser  melhor do que aquele que gozamos agora se permanecemos inconscientes na presença de Cristo

Sem dúvida existe o descanso e a suspensão da dor e do tumulto que sentimos enquanto estamos dormindo, mas a comunhão consciente com Cristo que gozamos presentemente nesta vida não pode ser desprezada. Há ocasiões em que suspiramos por um sonho inconsciente para sentir alivio dos cuidados deste mundo, mas o normal é desejarmos acordar para assumir novamente a vida consciente.

Os lampejos que a Bíblia nos dá sobre o estado intermediário sugerem fortemente um estado de consciência alerta. Embora seja uma parábola cujos elementos não podem ser pressionados demais, a parábola do rico e Lázaro sugere uma aguda consciência de ambos os homens. A parábola envolve uma conversação entre o rico e Abraão. O homem rico, consciente de seu tormento, clama por misericórdia a Abraão. Abraão responde:

“Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro somente males; e agora este é consolado e tu atormentado. E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá passar para cá.” [Lucas 16:25,26]

Então o homem rico apela para que uma mensagem seja enviada a seus irmãos que ainda estão vivos, para que eles sejam avisados sobre o lugar de tormento (v. 27-28).

Embora seja uma parábola Jesus pinta a cena do “seio de Abraão” como um lugar intermediário de felicidade consciente, e Hades como um lugar de tormento consciente.

Obviamente a cena tem lugar antes da grande ressurreição. A visão de João registrada no livro de apocalipse inclui cenas dos santos que partira, e esperam o estado final de glória:

“E, havendo aberto o quinto selo, vi debaixo do altar as almas dos que foram mortos por amor da palavra de Deus e por amor do testemunho que deram. E clamavam com grande voz, dizendo: Até quando, ó verdadeiro e santo Dominador, não julgas e vingas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra? E foram dadas a cada um compridas vestes brancas e foi-lhes dito que repousassem ainda um pouco de tempo, até que também se completasse o número de seus conservos e seus irmãos, que haviam de ser mortos como eles foram. [Apocalipse 6:9-11]

Aqui as almas dos mártires estão claramente em descanso em seu estado intermediário. Mas, este descanso não é um estado de sono inconsciente. É um descanso consciente no qual são capazes de conversar.

SPROUL, R. C. Surpreendido pelo Sofrimento. São Paulo: Cultura Cristã, 1998, p. 97-98.

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